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Impreparação e capacidade de resposta

Há muito tempo que algo do género era apontado como uma forte possibilidade, mas a realidade é que “ninguém” (países, instituições, organizações, pessoas...) estava verdadeiramente preparado para enfrentar esta pandemia.

Os efeitos devastadores que eventos semelhantes tiveram no passado foram normalmente desvalorizados fazendo fé no pretenso avanço civilizacional e no desenvolvimento do conhecimento científico.

Contudo, apesar da generalizada impreparação coletiva e individual, os contextos de partida, não eram idênticos e a capacidade de resposta, aos mais diversos níveis, também se tem demonstrado como elemento determinante no sucesso do combate ao problema.

É verdade que nestas coisas, como em tantas outras vertentes da vida, também é preciso um pouco de sorte, nomeadamente naqueles períodos em que ainda se desconhecia a verdadeira dimensão da ameaça, em que as decisões tomadas ainda não tinham sido implementadas, ou mesmo ao nível da responsabilidade individual no cumprimento do que é recomendado ou exigido.

Nestas alturas, é também mais fácil identificar o melhor e o pior de cada um de nós. O altruísmo e a resiliência convivem com o egoísmo e o baixar os braços.

Os “chico-espertos” que se aproveitam da situação para retirar vantagens (não só económico-financeiras) ou aqueles que só olham para o seu umbigo, julgam que conseguem passar entre os “pingos do vírus” e se salvam sozinhos, pode ser que se enganem...

É nestes momentos que verdadeiramente se testa (individual e coletivamente), a capacidade de adaptação, a tomada de decisão, a autonomia, a criatividade, a resiliência ..., no fundo que se testam as capacidades e competências, as metodologias, processos e instrumentos, as rotinas profissionais e individuais.

A título de exemplo, uma atividade profissional que dependa fundamentalmente de ferramentas digitais e de funcionamento em rede, ou um processo pedagógico que esteja centrado no professor que basicamente transmite e os alunos “reproduzem”, certamente que, desde que se dominem as “ferramentas tecnológicas”, não se ressentirão significativamente por estarem em teletrabalho ou em ensino à distância.

Porém, se isso for verdade, tal deve fazer repensar todo o processo presencial, pois, ou não será necessário ou deve ser substancialmente alterado uma vez que não está a ser potenciado como deveria.

Apesar de ser uma crise mundial, no mundo ocidental, nem todos estamos sob o mesmo tipo de pressão. Por exemplo: - uns estão na linha da frente, na maioria das vezes sem as condições de segurança que se exigiam; - outros numa segunda linha, menos visível e valorizada, mas que permite manter tudo a funcionar; - outros desesperados, fazendo contas à vida, ao verem um investimento de toda a vida em risco de ruir; - outros, a grande maioria, que em casa continuam (ou não) com a sua atividade profissional ou a cuidar de familiares contribuindo para um “normal” funcionamento da sociedade através de um indispensável equilíbrio individual e social.

Contudo, infelizmente, é neste último grupo, que tem a possibilidade de estar no conforto do lar (sem grandes preocupações), com alimentação, luz, água, TV cabo, internet e afins, a quem se exige que não saiam de casa que, por vezes, se verificam os maiores problemas. Lamentam-se que não aguentam, passeiam o cão 20 vezes ao dia, vão comprar pão diariamente (não gostam de torradas), vão dar uma corridinha higiénica à beira-mar, ou nas avenidas centrais das localidades, param para recuperar forças e rever amigos, vão visitar familiares que muitas vezes não viam durante semanas, chegam a casa e assumem-se como “médicos de bancada” e, nas redes sociais, dizem mal de tudo e todos, difundem, muitas vezes, por pura ignorância, notícias falsas, etc. etc.

Ora, nesta fase, estes “privilegiados” são um dos principais entraves ao controle e resolução do problema. São uma espécie de mato seco que serve de combustível para a propagação do fogo.

É um daqueles momentos onde é mais evidente que a irresponsabilidade, a negligência ou a ignorância de uns coloca em perigo a vida de todos.

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