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Eleições presidenciais no Egipto para reeleger Al-Sisi com a oposição silenciada

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Dezenas de milhões de egípcios voltam a ser convocados entre segunda e quarta-feira para eleições presidenciais que vão reeleger Abdel Fatah al-Sisi, o mentor do golpe militar de 2013 e que afastou desta campanha os principais opositores.

Sem rivais de peso após uma purga muito seletiva, a vitória do ex-marechal, 63 anos, está garantida.

Moussa Mostafa Moussa, o único candidato que não se retirou da contenda ou não foi detido, é um fervoroso adepto do presidente e optou pela quase total discrição durante a campanha.

No final, acabou por reconhecer que se apresentou para que o escrutínio não se assemelhe a um referendo, evitando fornecer mais argumentos aos que pretendem denegrir a “imagem” do Egito.

Neste escrutínio, os desafios ao chefe de Estado egípcio provinham, não da sociedade civil ou da “nebulosa islamita”, mas do próprio meio militar.

Assim, em 23 de janeiro, e logo após anunciar a sua candidatura, o antigo chefe de estado-maior Sami Annan foi perseguido por se ter envolvido na campanha “sem a autorização das Forças Armadas”.

Acabou detido e excluído das presidenciais após o anúncio da sua candidatura e está agora sob pressão para aceitar a prisão domiciliária e o silêncio, em troca da retirada de todas as acusações.

Ahmed Shafiq, antigo comandante da Força Aérea egípcia e o último primeiro-ministro de Hosni Mubarak, expulso dos Emirados Árabes Unidos, onde estava exilado, quando anunciou a intenção de se candidatar, foi conduzido a um hotel quando regressou ao Cairo.

Apenas foi autorizado a abandonar o edifício após desistir da candidatura no início de janeiro, permanecendo na prática em prisão domiciliária.

Com a eleição garantida, a principal preocupação do governo do Cairo consiste em garantir uma razoável taxa de participação para legitimar a reeleição de al-Sisi -- promotor do golpe de Estado que em julho de 2003 derrubou o presidente islamita Mohamed Morsi --, e contrariar os apelos ao boicote da oposição.

Nas eleições de 2014, que decorreram entre 26 e 28 de maio, al-Sisi obteve 96,91% dos votos contra Hamdeen Sabahi, com uma taxa de participação de 47,5% segundo os números oficiais, muito contestados pelas oposições.

Os apelos ao voto dos 59 milhões de potenciais eleitores foram permanentes, mas historicamente a participação nas eleições é muito baixa no Egito, com exceção das presidenciais de 2012, que elegeram Morsi, e as únicas que decorreram em liberdade e com garantias democráticas, com uma participação de 51,85% na segunda volta.

Agora, as purgas aos candidatos opositores que precederam a eleição foram sem precedentes, mesmo se comparadas com os cerca de 30 anos de regime de Hosni Mubarak, derrubado na revolução de 2011.

Al-Sisi parece convencido de que eleições genuínas poderiam desestabilizar um país com 96 milhões de habitantes, permitir aos seus inimigos islamitas o regresso à política ou interferir nos seus projetos para revitalizar a economia.

Nos primeiros quatro anos no poder, privilegiou a “estabilidade” em detrimento das liberdades e promoveu projetos de infraestruturas em larga escala e duras reformas de austeridade, enquanto a nível internacional se afirmava como o campeão contra a militância islamita.

Após as eleições, sugerem observadores citados pela agência Associated Press (AP), al-Sisi e os seus apoiantes poderão eliminar o limite de dois mandatos presidenciais, argumentando a necessidade de estabilidade económica e razões de segurança, e garantir a sua permanência no poder.

Mas a metódica eliminação dos candidatos opositores, com o tratamento mais duro reservado aos dois generais, Ahmed Shafiq e ao influente Sami Annan, podem sugerir alguma vulnerabilidade de al-Sisi e possíveis fissuras entre a cúpula militar que se uniu em 2013 para derrubar o presidente islamita.

As obras faraónicas, em execução ou em projeto, foram outra imagem de marca do primeiro mandato do antigo chefe militar, incluindo o início da construção de uma nova capital administrativa.

No entanto, e durante o seu mandato, a adoção de um programa económico do Fundo Monetário Internacional (FMI) em novembro de 2016 -- acompanhado de créditos de 12 mil milhões de dólares (9,7 mil milhões de euros) -- implicou uma alteração da política económica egípcia, até então muito apoiada nas ajudas dos países do Golfo Pérsico.

Para além da economia, outra obsessão de Abdel Fatah al-Sisi foi o combate contra a poderosa Irmandade Muçulmana, ilegalizada após o golpe de Estado de 2013, que dirigiu, e a filial do grupo ‘jihadista’ Estado Islâmico (EI) na península do Sinai, onde decorre uma impiedosa guerra desde há quatro anos.

O silêncio que impôs a todas as vozes críticas e um discurso maniqueísta em que se apresenta como o único garante da sobrevivência do Egito acabaram por ter algum acolhimento entre os parceiros ocidentais, que veem em al-Sisi um pilar da segurança regional, sobretudo após os sucessivos atentados ‘jihadistas’ contra as forças de segurança e a minoria cristã copta.

A necessidade de um “Egito estável” num Médio Oriente “totalmente caótico” tem justificado esta política, que tem incluído avultados negócios de vendas de armamento, da França à Rússia.

Como resumiu o Presidente francês Emmanual Macron quando recebeu o seu homólogo egípcio no Eliseu em outubro de 2017: “Recuso dar lições a um país amigo e cuja segurança é também a nossa”.