A agonia do Fanal

Fanal, 18 de Julho de 2025. Muitos automóveis, demasiados automóveis e gente. Demasiada gente!...

O Fanal está a tornar-se irreconhecível, e tudo o que por lá se vê é em excesso. Há árvores, Tis, mortos de pé; pelo chão vêem-se troncos desmembrados, mortos, de árvores centenárias que estão a desistir de viver. Mas, o mais confrangedor de constatar, são as já extensas áreas com terra vermelha exposta. O excesso de pisoteio humano está a destruir por completo o coberto herbáceo em algumas zonas. A terra está seca e calcada, já não há coberto vegetal que retenha as humidades atmosféricas. A juntar a todo este cenário, as vacas devoram a folhagem dos Tis, impedindo que estas árvores regenerem e se perpetuem.

O Til, caracteriza-se pela sua grande longevidade, pois vai emitindo rebentos a partir da base do tronco, que depois se transformam em novos troncos que duram séculos. Só que as vacas adoram as folhas do Til, impedindo a árvore de se perpetuar.

Os Tis do Fanal já lá estavam certamente quando a Madeira foi descoberta. Muito provavelmente são milenares… Mas estão a agonizar.

O mais espantoso é o facto de, aparentemente, ninguém com responsabilidades sobre esta área, parecer aperceber-se do que se está a passar!!!...

O Fanal que actualmente conhecemos, não é mais do que o esqueleto do que foi outrora uma Floresta Laurissilva milenar luxuriante. Desapareceram os arbustos e a vegetação endémica que faziam a transição das grandes árvores para o solo, bem como a vegetação herbácea rasteira, essencial para o enriquecimento orgânico do solo da floresta, e para a captação e retenção das humidades e chuvas atmosféricas.

Cronologia do Fanal

Em Novembro de 1982, através do Decreto Legislativo Regional 14/82/M, é criado o Parque Natural da Madeira. O Fanal é aí classificado como Zona de Repouso e Silêncio, reservada a … “recreio de contemplação e de acesso exclusivamente pedonal”.

Em Novembro de 1983, a Floresta Laurissilva, nela se incluindo o Fanal, foi classificada como Reserva Biogenética do Conselho da Europa.

Em Dezembro de 1999, a Floresta Laurissilva ascende à prestigiada categoria de Património Natural da Humanidade da UNESCO.

A Floresta Laurissilva integra a rede europeia Natura 2000, como Habitat de Interesse Comunitário.

Com o advento do novo milénio, tudo começou no entanto a mudar. Para pior.

Leva-se o asfalto até ao Fanal, com grande entusiasmo por parte das entidades que supostamente deveriam zelar pelos interesses dos valores naturais que então tutelavam.

E agora temos um Fanal a caminhar rapidamente para um colapso ecológico.

É por demais evidente que algo tem de ser feito, rápida e prolongadamente no tempo. Sou de opinião que uma significativa área do Fanal deveria ser totalmente vedada, de modo a não permitir a entrada de pessoas nem de animais. Esta acção perduraria por tempo indeterminado, enquanto se acompanharia a evolução da regeneração biológica daquele espaço.

Poderia dar-se uma ajuda com a plantação criteriosa de espécies que outrora lá estiveram presentes, e prestar muita atenção a um eventual surgimento de plantas invasoras.

Complementar esta acção com elucidativa informação a colocar no local, de modo a esclarecer correctamente o que se está a fazer. Teria certamente a compreensão e aceitação públicas.

Se nada for feito, as futuras gerações não perdoarão com certeza, a negligência, a inércia e a incompetência que levaram ao desaparecimento de um recanto de excepcional beleza e valor natural e patrimonial na Ilha da Madeira.

Henrique Costa Neves