Produtividade, salários e migrações
Muito se fala sobre o problema da produtividade do trabalho em Portugal, mas muitas vezes não se compreende a que tipo de produtividade se estão a referir. Vejamos um exemplo simples:
Um trabalhador serve 100 cafés por dia e, por cada café, o cliente dá-lhe 10% do valor do café em pagamento do seu serviço. Assim, se os cafés forem vendidos por um 1€, o trabalhador recebe 10€ ao fim do dia, se forem vendidos por 2€ recebe 20€ e se forem vendidos por 5€ recebe 50€.
Deste exemplo vemos que existe uma distinção muito grande entre a produtividade em termos de quantidade e a produtividade em termos de valor, porque em todas as situações a produtividade física é sempre a mesma, mas a produtividade em termos de valor é 5 vezes superior quando comparamos a última situação com a primeira.
Fica aqui a primeira pergunta que é: necessitamos que os portugueses produzam mais ou necessitamos que seja valorizado ou de maior valor o que produzem?
Os casos, que muitos conhecemos, de madeirenses que emigraram para o estrangeiro para continuarem a fazer o mesmo que faziam ou podiam estar a fazer na região mostra bem esta situação. Empregados de restaurante ou cuidadores de idosos, entre outros, que vivem hoje em outros países europeus onde recebem salários que lhes permitem ter outro nível de vida que nunca teriam na região, simplesmente pelo facto de receberem salários mais elevados porque esses países valorizam muito mais o resultado do trabalho que eles fazem.
Não considerei o caso da existência de alguns trabalhos em que a maquinaria e tecnologia usadas fazem com que a produtividade medida em termos de quantidade seja muito maior num país do que noutro, mas aqui Portugal teria de ter capacidade de investimento em maquinaria e tecnologia o que não me parece fácil no momento presente.
Voltando ao exemplo dos cafés. Na nossa região deixámos de ter pessoas para servirem os cafés a 1€ apesar de haver procura. Ao haver esta oportunidade de trabalho trabalhadores de outros países deslocam-se para a região. Fica a pergunta porque não se deslocam para os países que vendem os cafés a 5€?
A diferença é que os portugueses têm livre mobilidade para esses países, enquanto os imigrantes não têm. Além disso Portugal é (ou era) um local onde se arranjavam, com alguma facilidade, os “papeis” que lhes permitem, passado poucos anos, irem para os países dos cafés a 5€.
Vi numa reportagem na televisão um imigrante dono de um restaurante a dizer que as mudanças da lei, se aprovadas, irão provocar uma diminuição significativa do número de imigrantes porque Portugal perde atratividade de ser um ponto de passagem temporária para um destino melhor.
Termino com uma última pergunta: como é que se espera que os imigrantes a fazerem trabalhos que só permitiam aos nacionais terem uma vida com um mínimo de dignidade, vão conseguir pagar as dívidas que contraem para se deslocarem para Portugal, pouparem para enviarem para as famílias e ainda terem o suficiente para viverem com dignidade?