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A Gestão de Sobrevivência e a Vida em Gestão

Este mês trago-vos um desabafo daquilo que sinto, daquilo que está aos olhos de todos ou, pelo menos, dos meus. Todos os dias ouvimos na imprensa que a Madeira está melhor. Que há um crescimento económico, mês após mês, que o turismo bate recordes e que o investimento estrangeiro não para de crescer. Mas, ao mesmo tempo, basta pararmos e olharmos à nossa volta e entendermos a verdadeira Madeira. A Madeira dos baixos salários, das rendas incomportáveis, das oportunidades escassas.

Os nossos jovens continuam a sair e a não regressar. Um estudo da Comissão Europeia, de 2023, indica que a Madeira é uma das regiões da Europa com maior taxa de emigração jovem. Saem os jovens mais qualificados, os mais ambiciosos, os mais bem preparados para transformar a Madeira. Não encontram espaço numa terra, onde para eles não há futuro, uma Região empobrecida socialmente, economicamente e intelectualmente. Aos que ficam, enfrentam as consequências da “realpolitik” da governação hegemónica de uma força política.

O salário médio é inferior à média nacional, mesmo que a Região tenha cerca de 30 mil funcionários públicos, que detêm rendimentos superiores, num total de 134 mil trabalhadores. Ou seja, 1 em cada 5 madeirenses trabalha para o “Governo”, percentagem elevada, só comparável com a região do Algarve. Como podemos diversificar a nossa atividade socioeconómica, quando dependemos por um lado do setor público para garantir uma concepção de pleno emprego e, por outro, detemos uma dependência de ⅓ do PIB regional no setor do turismo? O talento é absorvido pela máquina estatal e pela economia dos baixos salários. Mata-se o risco, a ambição e a inovação. Não se estimula quem cria, favorece-se aqueles que não querem arriscar. Tudo isto acontece sem o mínimo de debate sério, sem uma visão coletiva, sem uma visão estratégica para o futuro da Madeira. A política regional reduziu-se a uma gestão corrente de ciclos curtos, onde o que importa é prometer e sobreviver. Em muitos casos, há gente que não é ninguém profissionalmente sem a sua carreira política, dependentes dela para existir. Estes indivíduos, que são de todos os quadrantes políticos, são sobreviventes do sistema, desistindo das pessoas comuns.

A politiquice, a intriga e os interesses individuais devem ser substituídos pela Policy. Precisamos de menos política e mais policy. Temos que discutir mais as políticas públicas que pretendemos para a Madeira, de redesenhamos uma visão de base comum, unânime entre partidos. Precisamos de gente que tenha uma vida independente, insubmissa a caprichos individuais e partidários, que façam um serviço genuíno à sociedade. Até quando vamos ignorar este flagelo? São por situações como estas, que pessoas como eu, decidem afastar-se da política partidária. Não o faço por gosto, mas porque simplesmente não me revejo no estado em que chegou a política e a Madeira. Espero um dia regressar à vida político-partidária, porque, quer queiramos quer não, são os partidos a força motriz do desenvolvimento da sociedade (ou pelo menos, deveriam sê-lo).

Chegou a hora de pararmos este ciclo vicioso e de mediocridade. A Madeira precisa de uma visão comum para o modelo económico que devemos estar dispostos a construir. Que tipo de liderança necessitamos e de que forma vamos trabalhar para além do “instinto de sobrevivência”? Precisamos de um propósito comum, de uma visão comum, de uma ambição comum. Aos políticos desta terra, deem-se ao trabalho de construir isso.