Será a criação do Provedor do Utente uma ideia repetida na Madeira?
O grupo parlamentar do JPP anunciou, neste sábado, que vai propor a alteração dos Estatutos do SESARAM (Decreto Legislativo Regional n.º 13/2019/M, de 22 de Agosto) com o objectivo de criar a figura do provedor do utente do serviço de saúde.
Na hora de apresentação, a deputada Lina Pereira disse que o objectivo da iniciativa “é tornar a participação do cidadão o mais plena possível (…), sabendo que, muitas vezes, o doente se encontra numa situação mais fragilizada, a designação do provedor do utente pelo Conselho de Administração do SESARAM, permitirá criar a proximidade e o acompanhamento necessários entre os serviços regionais de saúde e os utentes, bem como a salvaguarda dos seus direitos, de forma a garantir a equidade e universalidade da prestação destes serviços”.
No entanto, houve várias pessoas, em especial com participação política activa, que, ao DIÁRIO, fizeram questão de lembrar que a iniciativa não é nova, nem mesmo por parte do JPP.
Será mesmo que não? Terão já outras forças políticas feito proposta igual ou semelhante?
Para aferirmos se a proposta do JPP é nova ou se se trata de uma reapresentação, recorreremos a notícias da imprensa madeirense, com destaque para o DIÁRIO, e a informação do sítio na Internet da Assembleia Legislativa.
Há, no entanto, um aspecto que á fácil de verificar. Esta não é a primeira vez que o JPP apresenta a proposta de criação do provedor do utente. Foi a própria Lina Pereira, vice-presidente do grupo parlamentar do JPP, quem, na apresentação da iniciativa, lembrou que o PSD/CDS já chumbou idêntica iniciativa, anteriormente tomada.
De facto, pelo menos em outras duas ocasiões, o JPP tomou iniciativas na Assembleia Legislativa da Madeira, no sentido da criação do provedor do utente do serviço de saúde. Uma dessas vezes foi em Novembro de 2017 e outra em Setembro de 2023. Foi chumbado em Junho de 2018 e em 2022.
Tem razão o JPP quando diz que a iniciativa foi chumbada pelo PSD/CDS. O PSD justificou a oposição ao projecto com a existência do Gabinete de Apoio ao Utente do SESARAM, o Gabinete de Apoio à Família, o Portal do SESARAM e o Provedor da Administração Pública. Exemplos dados pela então deputada e médica Conceição Pereira. Foi em Maio de 2022.
No entanto, a nossa pesquisa com os termos ‘provedor do utente’ e saúde, permitiu identificar uma proposta no parlamento, numa altura em que o JPP ainda nem era partido.
Em Novembro de 2009, quando a Assembleia Legislativa se reunia no Madeira Tecnopolo, devido às obras nas instalações da Rua da Alfândega, o DIÁRIO noticiou que o Bloco de Esquerda tinha três propostas legislativas pendentes. Uma delas era “a criação da figura do Provedor do Utente do Serviço Regional de Saúde”.
Como se deduz, também foi chumbada, como noticiado no dia 19 do mesmo mês (Novembro de 2009): “Provedor do utente do SRS (BE): rejeitado, com votos contra do PSD votos a favor da oposição.”
Catorze anos depois, em Novembro de 2023, o Bloco voltou a propor a criação do Provedor do Utente, com idêntico desfecho.
Em Agosto de 2018, o PS-Madeira, quando liderado por Sérgio Gonçalves, propôs (como ideia) a criação do Portal do Doente, que teria pontos de contacto com o Provedor do Utente. A ideia, explicou, era responder às persistentes falhas no sistema de saúde regional, como aumento de listas de espera e dificuldades de acesso aos cuidados, dando "voz aos utentes" e pressão institucional para que o Governo tomasse medidas.
Realidade nacional
Vejamos, agora, a realidade nacional: no País não identificámos um Provedor do Utente, mas o Provedor de Justiça é, muitas vezes, chamado a pronunciar-se sobre questões de acesso à saúde, nomeadamente, por acções ou omissões ilegais ou injustas dos poderes públicos.
Aliás, a Provedoria da Justiça, em 2024, num relatório enviado à Assembleia da República, criticou o SESARAM sobre “longo tempo de espera (superior a três anos) no acesso a consultas e cirurgias de ortopedia”.
Provedoria da Justiça reconhece que tempo de espera compromete acesso à Saúde na Madeira
A Provedoria da Justiça indica que as queixas referentes ao Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira (SESARAM) revelaram que o direito de acesso a cuidados de saúde hospitalares num período considerado clinicamente aceitável permanece comprometido na Região. Isso mesmo conta do Relatório de Actividades do Provedor da Justiça 2023, hoje divulgado.
Quanto aos Açores, a situação é diferente. Naquele arquipélago, foi criado o cargo de Provedor do Utente de Saúde, em 2010. Mas em Abril de 2022, o Governo Regional anunciou a substituição do Provedor pela Entidade Gestora do Doente em Espera.
“A Entidade Gestora do Doente em Espera recebe, analisa, trata e responde às queixas dos cidadãos por incumprimento dos Tempos Máximos de Resposta Garantidos (TMRG) para consultas, realização de exames complementares de diagnóstico e cirurgias, sendo responsável pela gestão e acompanhamento das respetivas listas de espera”, explicou o secretário regional da Saúde e Desporto açoriano, sobre a decisão tomada em Conselho de Governo, no dia 28 de Abril.
Como se constata, o JPP já apresentou, pelo menos, por três vezes, contando com a presente, a proposta para a criação do cargo de Provedor do Utente, ainda que através de outro tipo de iniciativa. Por outro lado, outras forças políticas também já o fizeram, mesmo antes do JPP. Por tudo isto, avaliamos como verdadeiras as afirmações dos leitores do DIÁRIO, que o afirmam.