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O início duma nova era no financiamento e gestão do desporto profissional (III)

Neste artigo, procede-se à abordagem das responsabilidades de gestão (deveres e poderes), obrigações de informação e composição do órgão de administração, no contexto do novo regime jurídico das sociedades desportivas e lei comercial.

Envolve a última publicação, dum conjunto de três artigos inseridos no DN, sobre o financiamento e gestão do desporto profissional, decorrentes do quadro regulamentar que entrou em vigor no dia quatro de setembro.

O novo enquadramento introduz maior identidade entre os clubes fundadores e as suas sociedades desportivas, com substanciais alterações a nível de financiamento, transparência na estrutura societária, idoneidade, responsabilidades de gestão, composição do órgão de administração e fiscalização.

1 - Deveres de gestão e direito à informação

O novo regime veio impor condições de informação de natureza permanente a inserir em site, designadamente contrato de sociedade atualizado, contas dos últimos três anos, composição dos órgãos de administração e de fiscalização, contactos oficiais e a informação relevante no âmbito do cumprimento dos deveres de transparência na titularidade de participações sociais.

Paralelamente, aumenta a responsabilização dos corpos sociais das sociedades desportivas, relativamente às disposições aplicáveis pelo Códigos das Sociedades Comerciais (CSC) e dos Valores Mobiliários.

Neste âmbito merece especial referência a prestação anual de contas, designadamente relatório de gestão, contas do exercício e demais documentos conexos, para cada época desportiva, correspondente ao espaço temporal entre 1 julho dum ano e 30 junho do ano seguinte.

Com exceção das sociedades desportivas com participação noutras empresas, os documentos incluídos na prestação anual de contas devem ser apresentados à Assembleia Geral de Acionistas e por esta apreciados no prazo de três meses, a contar da data do encerramento de cada exercício anual (artigo 65.º do CSC), estendendo-se até 30 de setembro.

Por outro lado, os documentos incluídos na prestação anual de contas devem ser facultados aos acionistas ou sócios durante os 15 dias anteriores à data da Assembleia Geral, até 15 de setembro de acordo com aquela data limite (artigo 289.º do CSC).

O incumprimento destes prazos em épocas desportivas anteriores, por várias sociedades desportivas, incluindo no espaço da Região Autónoma da Madeira, e as responsabilidades acrescidas na sua administração e fiscalização à luz do novo regime jurídico, leva-nos a referir estes deveres.

2 - Composição do órgão de administração

As sociedades desportivas não vão poder continuar como sociedades fechadas e réplicas das estruturas dirigentes dos clubes fundadores, com débeis mecanismos de auditoria interna e frágeis processos de controle.

O órgão de administração é eleito em Assembleia Geral, cujos administradores podem não ser acionistas ou sócios, dependendo na sua composição, da estrutura acionista resultante da abertura do capital com observância dos direitos de preferência, razão pela qual, a posse da maioria do capital ou direitos de voto é uma questão fundamental.

A composição do órgão de administração, passa a integrar obrigatoriamente, com direito a participar em todas as reuniões, um associado do clube fundador (sem direito a voto) eleito em assembleia geral expressamente para o efeito, e pelo menos um administrador designado pela sua direção com direito de veto no âmbito dos direitos especiais de sócio.

Assim, os associados do clube fundador têm direito por inerência, a indicar diretamente um membro, que será os seus olhos, os seus ouvidos e a sua voz no órgão de administração.

Nas situações de subscrição pública de capital, uma minoria de acionistas que represente pelo menos 10% do capital social, pode designar pelo menos um administrador, nos termos do Código das Sociedades Comerciais (aconteceu com a SAD do SLB na ultima assembleia geral eletiva).

Entretanto passa a aplicar-se na composição da administração e fiscalização das sociedades desportivas, a proporção mínima de 33,3% de pessoas de cada sexo (lei das quotas de género).

Neste contexto organizacional, a coexistência de administradores não-executivos e executivos, estes constituídos em comissão executiva, com repartição de poderes entre o presidente do órgão de administração (chairman) e o presidente da comissão executiva (CEO), é uma boa solução corporativa para garantir a representatividade da estrutura societária.

3 - Poderes de gestão

Os poderes de gestão a nível do modelo empresarial e respetivas unidades de negócio, encontram-se concentrados no órgão de administração, e dele espera-se uma postura profissional e diligente na conjugação do sucesso desportivo com os resultados financeiros.

Não basta ter dinheiro. Dispor de dinheiro é uma condição necessária, mas não é garantia de sucesso. É preciso obter resultados desportivos, libertar meios financeiros para financiar a atividade corrente e investimentos, assim como remunerar os capitais investidos (à semelhança do que se passa com os empréstimos obrigacionistas).

Esta envolvente exige cada vez mais dirigentes com forte maturidade e experiência de liderança em contextos desafiantes, para poderem balancear a racionalidade da gestão com a emoção partilhada pelos adeptos e público em geral.