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Pedro Ramos chumba nos testes

As dificuldades do combate a uma pandemia são naturalmente incomensuráveis. Bem sabemos. Contudo, quando aos naturais obstáculos dai decorrentes se juntam a inabilidade e truculência política do responsável pela saúde pública regional adensa-se o cenário de pessimismo. Inabilidade na forma de comunicar e de lidar com a imprensa, condicionando o trabalho dos jornalistas e desta forma furtando-se ao escrutínio e prestação de contas aos quais, enquanto servidor público, está sujeito. Truculência sem paralelo com qualquer outra autoridade de saúde do país. Veja-se a elevação, transparência, e porque não dizê-lo, a educação, com que se apresentam nas conferências de imprensa o diretor regional da saúde dos Açores e a diretora geral da saúde, Graça Freitas. Ao Secretário da Saúde (SS) Pedro Ramos bastaria mimetizá-los. Já seria um grande avanço. Talvez não esteja apto para mais. O problema coloca-se no foco do habitual discurso político de pendor paroquial que aponta exclusivamente para a difusão de uma estatística comparada, ou seja, uma espécie de campeonato onde militam apenas um ou dois oponentes imaginários – o continente e às vezes os açores - e onde a única regra para vencer o campeonato consiste em apresentar baixos números de infetados e de óbitos. Ao contornar as perguntas dos jornalistas, o SS não estabelece a necessária relação entre os poucos casos de infetados com o baixíssimo número de testes realizados. Menos de metade do que o número realizado nos açores 2413 que comparam com mais de 4000 nesta região. Até ontem apenas 136 testes realizados nas estruturas residenciais para idosos. Um número assustadoramente baixo, se pensarmos que 16% da população tem mais de 65 anos e uma parte substancial está institucionalizada. Com um stock de 15 000 testes enviado pelo “lobo mau” da República e de outros 70 000 alegadamente encomendados aos EUA, não se percebe a baixa taxa de testagem, exceto se a preocupação for a de manter artificialmente os números. Nomeadamente no que concerne ao rastreio de casos positivos assintomáticos ou com sintomas leves que, naturalmente, só engrossariam as cifras negras após testagem. E esse parece ser o caminho. Veja-se por exemplo a ousadia de a enfermeira Bruna dizer que a última norma emanada pela DGS sobre as regras de testagem está a ser analisada pela Região para – pasme-se – adaptação à RAM. Até na pandemia a obsessiva e já saloia especificidade parece sobrepor-se a tudo. Esquece-se que por definição pandemia não tem fronteiras, nem especificidades. E ainda menos dentro do mesmo território nacional. Talvez a única especificidade de facto que a RAM apresenta em relação ao restante território nacional é de incluir os membros do Governo Regional em grupos prioritários para testagem! No mínimo, escandaloso. Por outro lado, o SS e o seu acrítico staff parecem ter encontrado neste dramático fenómeno epidémico, uma rara e inusitada oportunidade de também colocar o serviço regional de saúde em quarentena. Mantendo-o a salvo das potenciais contaminações das denúncias da sua completa degradação fruto de um desinvestimento estrutural e da sua secundarização no elenco de políticas públicas desviando a atenção da opinião pública da opção por renovar aposta em obras públicas. Pior será certamente a acentuação dessa degradação no pós-pandemia agora com novas, mas sempre infundadas, justificações.Mas a inabilidade comunicacional do SS tem consequências muito mais gravosas e que transpõem o cariz político. As repercussões da imputação de culpabilidade a uma família numerosa pela nova cadeia de contágio de COVID-19 em Câmara de Lobos ultrapassa todos limites mínimos de razoabilidade e do bom senso de governação. São afirmações com cariz discriminatório que num ambiente tão circunscrito como o da freguesia de Câmara de Lobos facilmente redundará num lamentável episódio de estigmatização social com marcas e consequências não desprezíveis. Mas é também de assinalar negativamente a forma como o SS enjeitou expressamente qualquer responsabilidade – ao menos parcial - dos serviços de saúde no descontrolo da situação.Só que faltou o contraditório. Ou seja, faltou confrontar a versão insinuosa do SS de imediata acusação com a versão dos próprios. Pelo que ouvimos – numa rara paragem pelos serviços mínimos da RTP-M - um dos familiares infetados alega que cumpririam com as regras de confinamento/quarentena e que, inclusive, o retorno à atividade profissional de alguns membros da família foi validado pelo centro de saúde local. Em síntese, faltou testes pós quarentena, para que essa validação ocorresse com a fiabilidade exigível, e isso parece que ninguém quer assumir. Mas é o que temos! Após décadas de um discurso político de taberna, estávamos certos que havíamos dado um passo adiante. Obviamente um equívoco. Ou apenas uma expetativa não concretizada. Os momentos de crise e de dificuldade são os mais fiáveis testes de resiliência e de consistência à envergadura ética e politica dos governantes. Chamado a prestar provas o SS Pedro Ramos chumbou!

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