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A Baía da Liberdade

Em forma de meia lua e aberta ao cardeal do sol nascente, a Baía de Machico, conduz-nos a um percurso longo da nossa história e a um lugar mítico onde o Criador se aliou às forças da natureza na criação deste pequeno Éden à beira-mar debruçado. Um rincão solarengo, aberto por vocação ao mundo e aos alísios merujados de Sul. Ventos que a pintam de maresia e de sonhos de liberdade, pousio de gaivotas perdidas, que de longe trazem noticias de velhas ditaduras e de democracias adiadas por medos do voto popular.

Nesta Baía de tantas madrugadas mal dormidas, tem sido prodiga de registos de desastres naturais e de velhas reivindicações em favor de um Estado de Direito e mais solidário com as populações da insularidade atlântica. Nestas contendas, a Revolta da Madeira de abril de 1931, foi uma dessas lutas que opões as forças militares revoltosas da Madeira e as tropas da ditadura de um dos regimes europeus mais avessos aos valores da democracia. Uma Revolta militar com apoio de milhares de madeirenses enfurecidos pela falta de farinha, pelo aumento do preço do pão e por um nível assustador de desemprego. A rebelião em êxtase tomou conta das ruas da cidade, que se contorce com o surpreendente poderio naval que, pela manhã de 30 de abril, aportou ao largo do Porto Santo, composto por de 17 vasos de guerra e 6 hidro-aviões ao comandado do Ministro da Marinha de Salazar.

Passadas algumas décadas, é de imaginar o alvoroço que abalou aquela Ilha, protegida pela Senhora da Graça, que do alto daquele rochedo afugentava a tamanha esquadra das vistas dos seus crentes desprotegidos. Entretanto, com o avançar da manhã, e depois de concluído o plano de operações, o pânico na Ilha esfria-se com a partida da esquadra em direção à ilha insurreta, bombardeada no Caniçal, destruindo a guarnição de artilharia dos militares revoltosos ali posicionada, permitindo em segurança o desembarque do primeiro contingente de tropas de Lisboa. Começa assim a derrube de mais uma intentona contra o centralismo do Estado Novo e, com ele, esmorece o movimento da causa autonomista que envolvia algumas patentes aquarteladas na Madeira. A situação endurece e toma rosto de derrota com as trincheiras fortificadas à entrada de Machico, apinhadas de soldados madeirenses, totalmente esmagadas pelo tiroteio cerrado e demolidor das metralhadoras do contingente deslocado do Caniçal e dos bombardeamentos lançados ao largo da venerável baia pela poderosa Esquadra Naval. Um cenário de guerra nunca antes visto por estas bandas que, militarmente, pões fim aos sonhos de mais uma Revolução insular contra o centralismo do Estado Novo.

Passados 43 anos sobre a Revolta da Madeira, a Baía de Machico, mantem-se épica ao lado da sua história e do pendulo sonhador das suas gentes, levando-as nos seus momentos mais difíceis a olhar mais longe, mais além do lastro das suas amarguras e derrotas dos dias que nunca têm fim. Presa ao mar como uma deusa de olhar atento e comunicativo, mantem-se ao leme da Terra de abril pela sua fidelidade ao oceano, aos sussurros dos ventos de Sul e aos brados de vitória das madrugadas floridas como o daquela manhã de abril de 1974. Uma Baía de liberdade sempre aberta aos porto do mundo.

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