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27 de Julho, o meu tempo!

É comum ouvir dizer: “no meu tempo fazia-se assim, no meu tempo fazia-se assado”, “no meu tempo é era bom”, etc., etc.

“No meu tempo” é o que alguém diz quando se quer referir a uma época passada, normalmente na juventude de quem recorda tempos passados: “ah!, no meu tempo é que…!”

“No meu tempo”, é uma forma de viver no passado, aquela coisa que enxameia memórias que, mesmo não tendo sido as mais felizes, configuram emoções que quando guardadas com alguma religiosidade reavivam vivências que vão perdurando vida fora e que, mesmo que tenham sido reais, já não o são, porque o tempo, esse, já passou!

Hoje, o hoje que vivemos, é que tem de ser “o meu tempo”! É para que possamos estar hoje que vivemos o ontem, o anteontem, todos os anteontem que se foram seguindo fazendo com que “o meu tempo” seja hoje e não ontem, porque o não haver dois dias iguais faz com que os hoje sejam sempre diferentes.

Vivemos, hoje, tempos em que as pessoas, ou alguns grupos de pessoas se sentem ofendidos quando outros grupos de pessoas não pensam da mesma maneira. Qualquer opinião, qualquer crítica, qualquer elogio pode ser razão para que alguém se sinta marginalizado, ofendido. Estamos vivendo um tempo em que a conversa saudável, a troca de ideias salutar para que nasçam novas ideias é um passo para uma intolerância cada vez mais preocupante. Se uma “tribo” decide que estamos errados só porque mostramos uma opinião diferente, somos barrados, cancelados, banidos, ostracizados sem hipótese de argumentar a nossa possibilidade de podermos ter pontos de vista diferentes. Discordar não significa, não pode significar, inimizade!

Vivemos num tempo em que não tolera “derrotas” ou “falhanços”, daquelas que fazem com que possamos aprender com os nossos erros.

Há, sempre haverá erros, mas hoje, a intolerância instalada não permite evoluirmos através dos mesmos. O sistema educativo está feito para que o sucesso, mesmo que artificial, seja uma realidade, os alunos são encorajados a não aceitarem os seus próprios erros e com isso aprenderem que a vida tem altos e baixos, sucessos e fracassos e que é com a conjugação dos fracassos e dos sucessos que vamos criando os “nossos tempos”, aqueles que mais tarde servirão para que possamos dizer “no meu tempo era assim…”!

Vivemos tempos estranhos, hoje, com os valores de ontem a serem alterados e questionados todos os dias, fazendo com que haja uma enorme fatia de nós a cada vez mais dizer “no meu tempo”, com os valores que balizaram os “nossos tempos” a serem cada vez mais gotas no enorme oceano que foi sendo criado pelo “politicamente correcto”…

Por outro lado temos de reconhecer que esta é uma realidade que foi atravessando a humanidade desde sempre, e que há, e há de continuar a haver, muita gente a transmitir para o futuro uma mensagem de tolerância, mesmo que seja cada vez maior o grau de intolerância que, devagarinho, sem que nos demos conta, leva a guerras sem explicação em análises posteriores – esta foi (é) uma guerra sem explicação!

É também verdade que o que vivemos parece pior do que o passado, no tal “meu tempo” e para trás, mas não é: é apenas um mal diferente modulado pelos “avanços” da civilização (sei ser uma realidade mas, para mim, mesmo sendo um mal diferente modulado pelos avanços civilizacionais, um mal é sempre mau…).

Agora pode parecer pior, mas se nos lembrarmos da Inquisição, das guerras intermináveis, das guerras mundiais, do nazismo e por aí adiante, vemos que o hoje é o tempo que temos de aceitar ir vivendo sem se deixar ficar “no meu tempo”!

O meu tempo é o hoje, por muito que possa custar.

Viver um dia atrás do outro, com uma noite a meio, é o que é preconizado para que possamos encarar todas as mudanças que os “avanços” da civilização arrastam consigo e que, por outro lado, pode levar a pensar que se o hoje é hoje, para onde será que nos leva o amanhã? Se é para o hoje que temos de viver, chegando ao fim do hoje, chegamos ao fim de um ciclo para o qual o amanhã não é chamado, logo se não chegarmos ao amanhã teremos cumprido com a meta que nos propusemos cumprir!

Hoje 27 de Julho termina quando o amanhã se tornar hoje e assim nascer um novo amanhã, uma nova esperança…