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A investigação na área da Desinformação

A verificação dos factos – jornalísticos ou não – tem de ser uma prioridade não só para os media como também para as entidades governativas

Tive a honra de participar no I International Workshop Disinformation Research, que se realizou na Universidade de Málaga, onde apresentei o meu projeto de tese de doutoramento. O encontro reuniu grandes personalidades internacionais da área que partilharam os seus trabalhos de investigação. Graças ao formato descontraído do evento, que foi bastante restrito em relação ao número de participantes, o que facilitou a proximidade, pude conviver com quase todos os intervenientes. E as formalidades caem ainda mais por terra em Espanha quando todos, desde catedráticos a estudantes, se tratam por tu. Entre risos e boa disposição, por momentos, esquecia-me mesmo que estava a falar com os suprassumos da Desinformação.

Para além de uma ocasião para divulgar o meu trabalho, encaro sempre este tipo de iniciativas como uma excelente oportunidade para aprender. Como tal, em vez de resumir neste espaço a minha exposição, achei que seria interessante transmitir-vos algumas notas sobre o workshop.

Antes de mais, despertou-me interesse as diferenças em relação à utilização ou não do termo fake news, que rapidamente foram sanadas, deixando-se logo de parte esta discussão sobre a variedade concetual. É que, por um lado, há quem defenda que não se deve utilizar o termo, porque o seu conceito é inadequado ou insuficiente, uma vez que não capta toda a complexidade das formas de manipulação da informação. É que estamos perante um oxímoro, pois se estamos a falar de ‘news’, deveríamos referir-nos a informações verificadas e não falsas (fakes). Por outro lado, há quem continue a achar que o uso é correto porque as fake news podem ser entendidas especificamente como notícias falsas ou, de forma mais ampla, representarem diferentes formas de desinformação, ou seja, informação falsa, sendo que neste caso a utilização do termo em inglês se justificaria por ser bastante comum e reconhecido pela sociedade. Obviamente, não foi a primeira vez que as minhas reflexões extravasaram as leituras científicas, pois esta temática tinha sido já abordada várias vezes em diferentes trocas de impressões, tanto com a minha orientadora de tese e professores como com outros doutorandos e até no meu círculo de amigos.

Foi também bastante positivo perceber como há plena consciência do impacto que a desinformação pode ter no jornalismo a vários níveis, sublinhando-se a necessidade de os meios de comunicação social estarem em constante adaptação, valorizando inclusive o papel das plataformas de fact-checking. Como antiga jornalista, e atendendo a que muitos dos presentes eram ou foram também jornalistas, admito que os dias de hoje, onde sobretudo através das redes sociais qualquer pessoa pode publicar e até mesmo tornar conteúdos virais, fazer jornalismo é um desafio ainda maior. Como tal, a verificação dos factos – jornalísticos ou não – tem de ser uma prioridade não só para os media como também para as entidades governativas.

Finalmente, merece destaque a presença no evento de membros do projeto IBERIFIER, um observatório de meios digitais de Espanha e Portugal que faz parte do European Digital Media Observatory (EDMO), um organismo financiado pela Comissão Europeia. Coordenado pela Universidade de Navarra (Espanha), este ‘hub’ é composto por representantes de doze universidades, cinco organizações de fact-checking e agências de notícias e seis centros de investigação multidisciplinar. O coordenador do projeto, Ramón Salaverría, destacou algumas das prioridades de investigação ao nível da Europa, nomeadamente no que concerne às narrativas desinformativas; ao combate à manipulação e à ingerência da informação no estrangeiro; ao rastreamento da desinformação para além das redes sociais; à diversificação de temáticas, indo ao encontro dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável definidos na Agenda 2030; à investigação interdisciplinar e à alfabetização mediática dirigida também aos menos jovens.

Em jeito de conclusão, sublinho que, apesar da vasta literatura que tem sido produzida sobre a temática e das inúmeras medidas desenvolvidas, há muito ainda por explorar, até porque, uma vez que a União Europeia continua a destinar verbas para projetos que têm como principal objetivo o combate à desinformação, a evolução continuará a ser uma constante.