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Mundo está “cheio de celebridades só por o serem”

Quem o disse foi arcebispo de Boston, Sean O’Malley, ontem em Lisboa

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O arcebispo de Boston, Sean O’Malley, defendeu ontem que mundo está “cheio de celebridades só por o serem, cheio de competição, individualismo e consumismo”, que só poderá ser combatido com a “santidade” e com protectores e cuidadores.

A ideia foi defendida por O’Malley, 73 anos, ao agradecer o doutoramento ‘Honoris Causa’, atribuído hoje pela Universidade Católica Portuguesa (UCP), sob proposta da Faculdade de Teologia, como reconhecimento pelo apoio à comunidade portuguesa nos Estados Unidos.

“O mundo já tem muitos ‘cowboys’ e celebridades, pelo que precisamos de mais protectores e de cuidadores e de uma maior solidariedade”, salientou o laureado, lembrando as “ameaças radicais” actualmente existentes.

Na bem-humorada intervenção em que agradeceu a distinção, num português fluente, o arcebispo de Boston criticou a “cultura que privilegia o estrelato e a celebridade”, baseada no “individualismo”, em detrimento de uma vivência comunitária, com base “na fé e na solidariedade”.

“O mundo precisa de construtores, de cuidadores, com maiores e melhores valores humanos, não de celebridades”, insistiu, perante uma assistência que encheu o auditório da UCP, numa cerimónia presidida pelo cardeal de Lisboa, Manuel Clemente.

“Ser santo é ser totalmente humano, trabalhar junto das comunidades”, acrescentou O’Malley, natural de Lakewood, no Estado norte-americano de Ohio, onde nasceu a 29 de Junho de 1944, filho de pais irlandeses.

Segundo O’Malley, doutorado em Literatura Espanhola e Portuguesa, foi por trabalhar próximo das comunidades em diversos locais dos estados Unidos que aprendeu a falar português, destacando as vastas comunidades de portugueses, brasileiros e cabo-verdianos -- “devo-lhes” muito ao que sou hoje”.

Isso mesmo foi destacado no “laudacio”, proferido pelo padre Armindo dos Santos Vaz, “padrinho” do doutoramento, lembrando que O’Malley fala variadíssimas línguas (latim, italiano, português, inglês, francês e alemão, entre outras) e dialectos (os diferentes crioulos das Antilhas e das Caraíbas).

“Tal permitiu-lhe aproximar e compreender as comunidades em que estava inserido”, salientou o professor catedrático jubilado da Faculdade de Teologia.

Através da reitora Isabel Gil, a UCP lembrou que, além da ajuda às comunidades portuguesas nos Estados Unidos, o cardeal tem apoiado, através da diocese de Boston, a própria universidade portuguesa.

O cardeal Sean O’Malley, nomeado arcebispo a 1 de Julho de 2003, é membro de várias congregações e conselhos da Santa Sé e integra o chamado ‘G9’, o grupo restrito de cardeais que o papa escolheu para se pensar as reformas da cúria romana e das instituições da Igreja.

Um dos seus livros, ‘Anel e Sandálias’, publicado pela Paulinas Editora (2010), está traduzido em português.

Em 1985, foi agraciado com a Comenda da Ordem Infante D. Henrique, em reconhecimento pelo notável trabalho junto da comunidade de luso-americanos.

O lema das suas armas cardinalícias é ‘Quodcumque dixerit facite’ (’Fazei tudo o que Ele vos disser’), a frase que Maria, mãe de Jesus, diz aos serventes nas bodas de Caná (Jo 2, 5).

Em 2016 foi condecorado com a Grã-Cruz da Ordem do Infante Dom Henrique pelo Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, por serviços prestados às comunidades portuguesas nos Estados Unidos, nomeadamente em Washington e depois em Fall River.