Crónicas

VAR eleitoral

A quarta ilação é que o PS não pode ignorar a idiossincrasia do povo madeirense, o seu apego à Autonomia e a existência de uma cultura jardinista de 40 anos de criação do inimigo externo

Para o bem ou para o mal, as eleições europeias foram nacionalizadas e regionalizadas, sendo vistas como as primárias dos sufrágios do próximo outono. Tenho dúvidas sobre a razão plena deste ponto de vista, tendo em atenção que há gente esclarecida que votou pelo que se passa na União Europeia, e tendo em conta as propostas dos diversos partidos e as competências e colocação dos candidatos nas respetivas listas. Estes eleitores poderão mudar o seu sentido de voto em futuras eleições. Mas também é certo que muitas pessoas votaram em função da forma como têm sido governados no país e na região, pela maneira como têm trabalhado as oposições e face ás perspetivas de alternativas que existem para as legislativas regionais e nacionais. A verdade é que esta foi a sondagem das sondagens e contraria alguns estudos que têm vindo ser realizados, nos últimos meses, na Região. É por isso que muitos ficaram surpresos perante os resultados e ilações mais corretas, permitam a ironia, só com recurso ao VAR (vídeoárbitro) eleitoral, como no futebol.

Em primeiro lugar, foi positivo que a abstenção tivesse descido 4 pontos percentuais em relação a 2014. Os apelos à participação surtiram algum efeito, embora estejamos muito longe dos níveis de votação da média dos países da União.

A segunda grande conclusão é que em setembro não haverá maiorias absolutas para ninguém, o que já se adivinhava tendo em conta os resultados das regionais de 2015, onde o PSD obteve essa maioria por apenas 12 votos.

A terceira verdade é que o PSD não está tão fraco como se dizia e com a remodelação governamental de há 2 anos o partido uniu-se face à ameaça de voltar a perder poder. A vitória do PSD por mais 12 pontos percentuais que o PS é significativa e está para além do que era previsível. É evidente que beneficiou de algum eleitorado do JPP que não concorreu ao sufrágio e que poderá ter havido algum voto útil no PSD de eleitores mais informados que temiam a não eleição da candidata do partido colocada em 6º lugar na lista nacional. Mas o que mais beneficiou o PSD foi a teimosia do Governo da República em não resolver problemas da Região, como por exemplo a revisão do subsídio de mobilidade. António Costa é o grande vencedor a nível nacional e o grande perdedor no plano regional. A estratégia socialista foi a maior aliada do PSD nestas eleições e se o PS não perceber isto, então pode dar por perdido o combate de setembro.

A quarta ilação é que o PS não pode ignorar a idiossincrasia do povo madeirense, o seu apego à Autonomia e a existência de uma cultura jardinista de 40 anos de criação do inimigo externo. O resultado fica muito aquém do que era esperado, face à grande campanha realizada, pois obtém, apenas, mais 3 pontos que em 2014. A substituição da eurodeputada sem explicação plausível e uma certa euforia de vitória com laivos de jactância dos seus dirigentes, não foi apreciada pelos eleitores. O PS tem que perceber que uma coisa é a avaliação que as pessoas fazem sobre a governação da geringonça no país, outra é o que os madeirenses pensam sobre a falta de boa vontade do Governo Central na solução dos problemas pendentes entre a Região e a República. A não ser assim, não há candidato que lhe valha por mais popular que seja.

A quinta ilação é que a bipolarização falhou, o CDS teve resultado encorajador, embora a sua candidata estivesse num lugar não elegível, e prepara-se para ter um papel decisivo a partir de setembro na governação da Madeira. Obteve o melhor resultado do partido em todas as regiões do país e se o CDS nacional tivesse repetido esse score, teria eleito 2 eurodeputados e atingido os seus objetivos.

A sexta ilação é que os novos partidos da área do centro e da direita (Aliança, Iniciativa Liberal, Basta, Nós Cidadãos) não vingaram, mas atenção à votação do Partido dos Reformados (PURP) que obtém 1,6% e que, com o candidato já anunciado para as regionais, deverá entrar no Parlamento Regional, o mesmo podendo acontecer com o PAN que obteve um excelente resultado, a exemplo do que tinha acontecido nas europeias de há 5 anos.

A sétima leitura é que tal como a nível nacional, a geringonça fez bem ao Bloco de Esquerda e mal ao PCP, o Livre não se impõe, o PDR já era e o PTP vai ter que lutar muito para manter o lugar na Assembleia Legislativa.

Apesar de estarmos a menos de 4 meses das eleições regionais, nada está decidido, pois há cerca de 30 mil eleitores que se abstiveram e que provavelmente no outono irão votar e há que atender a que os pequenos partidos, que ficaram muito aquém de ter um resultado que permitisse eleger um deputado para o Parlamento Regional, somaram quase 11 mil votos. A disputa promete.