Crónicas

Uma greve justa

Na Madeira, zona atlântica onde os cientistas asseguram que estão a acontecer importantes e gravosas alterações no clima, já tivemos, no espaço de poucos anos, episódios extremos

Nem tudo está perdido no nosso Mundo. A recente greve dos estudantes, um pouco por todo o lado, contra as alterações climáticas, demonstra que há uma juventude que tem referências e valores e que pensa no seu futuro e no das novas gerações. As ideologias estão a ser substituídas por causas abrangentes e transversais aos diversos pensamentos políticos. Recordo que foi a jovem Greta Thunberg que começou este movimento imparável de pressão para que os Governos tomem decisões que levem a uma redução mais rápida das emissões de dióxido de carbono. A estudante sueca de 13 anos, começou a faltar à escola para protestar todos os dias, frente ao Parlamento, contra as alterações climáticas e a falta de ação do Governo do seu país. Empunhava um cartaz onde se podia ler: “Greve Escolar pelo Clima”. Rapidamente, por via das redes sociais, o alerta chegou a milhões de jovens que abraçaram a causa e a 15 de março fizeram paralisações e manifestações em mais de 100 países, conseguindo a adesão de 9 milhões de estudantes de todos os graus de escolaridade, desde alunos dos jardins de infância a candidatos ao doutoramento, inclusive na Madeira. Foi uma lição para nós, os mais velhos, que há muito andamos a brincar com o clima e que menosprezamos os sinais da mãe-natureza.

Na Madeira, zona atlântica onde os cientistas asseguram que estão a acontecer importantes e gravosas alterações no clima, já tivemos, no espaço de poucos anos, episódios extremos do que pode vir a suceder com mais frequência e com consequências nefastas para pessoas, bens e para o ambiente. Primeiro, em 1993 e depois em 2010, as chuvas torrenciais que num período muito curto, deixaram um rasto de destruição e de morte que ainda temos na memória. A seguir, foram os verões com temperaturas altíssimas e grandes incêndios, particularmente em 2016, que arderam a floresta, casas e vidas e com o fogo a descer, assustadoramente, da montanha até ao centro do Funchal.

Há 14 meses escrevi neste mesmo espaço uma crónica, titulada “Atrás do tempo, tempo vem” onde abordei este assunto das alterações climáticas nas nossas ilhas, e que relembro: «Infelizmente, ainda, há muitos, a começar pelo presidente dos Estados Unidos que negam as evidências e os alertas dos investigadores e cientistas. Outros, muito muitos mais, estão avisados, mas pouco fazem para inverter esta dramática situação que, ao contrário do que se previa, não será vivida pelos nossos descendentes, mas já está em cima de todos nós.

Um estudo divulgado recentemente pela Universidade de Stansford, na Califórnia, alerta que estamos a assistir a uma extinção em massa de vida na terra, com uma “aniquilação biológica” da vida selvagem, já que mais de 30 por cento das espécies de vertebrados estão em declínio, tanto na população como na distribuição geográfica. Os cientistas garantem que este é um prelúdio do desaparecimento de muitas outras espécies e da degradação que torna possível a nossa civilização.» Por outro lado, um relatório recente das Nações Unidas, concluiu «que 884 milhões de pessoas em todo o Mundo, maioritariamente em África, não têm acesso á água potável, a saneamento básico e a tratamento de esgotos, o que constitui um drama humano, com as doenças a matarem, por ano, 360 mil crianças com menos de 5 anos. A ONU fala, também, numa perigosa contaminação do ar, água e solos de consequências muito graves para um desenvolvimento sustentável»

No mesmo texto referia um outro estudo, envolvendo 10 mil europeus, que revela que a maioria está preocupada com os efeitos das oscilações climáticas, em particular nos oceanos, mas acham que o pior já aconteceu e, mais preocupante, acreditam que «os humanos só parcialmente contribuíram para essas alterações no clima». Quando assim é, dificilmente, os governos ganham coragem para tomar as medidas que se impõem, pois não sentem a pressão dos movimentos sociais e dos cidadãos». Por estes lados, a Estratégia de Adaptação da Madeira às Alterações Climáticas, identifica vários impactos e vulnerabilidades do arquipélago, como o aumento da temperatura, a diminuição da precipitação, a redução significativa dos caudais das nascentes, a subida do nível do mar, a ameaça de cheias, o aumento do risco de incêndios, a ocorrência de deslizamentos, o aparecimento de novas doenças transmitidas por vetores (mosquitos), as novas pragas na agricultura e na floresta e a redução da biodiversidade.

Recordo o que escrevi há ano e meio: «o mais dramático é que há muita gente a duvidar ou a menosprezar estas mutações climáticas e aquilo que cada um de nós deve fazer para reduzir o consumo energético, baixar as emissões de gases, fazer decrescer a poluição e minimizar todos os riscos associados ao “novo” clima. O tempo é de convencer e envolver todos na batalha pela sobrevivência!». Com esta greve, os nossos filhos deram-nos uma lição. Sigamos o seu exemplo e façamos greve, se for preciso, para salvar o Planeta.