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Miguel Albuquerque encetou uma renovação que ficou a meio da ponte, mas atenção que os vícios do passado estão lá, persiste no PSD uma cultura de poder absoluto

Algumas pessoas ficaram admiradas e outras estupefactas pelo líder do CDS Madeira ter dito que o partido está ideologicamente mais próximo do PSD e mais distante do PS. Rui Barreto limitou-se a constatar uma evidência que vem desde a criação dos partidos em 1974. Ao contrário do que aconteceu na maioria dos países europeus, em que a política foi dominada, após a Segunda Grande Guerra, por 2 grandes partidos: um conservador ou democrata-cristão e outro social-democrata/socialista, que se iam alternando na governação, o caso português teve essa originalidade chamada PSD que nasceu entre o CDS e o PS, alimentado pelo carisma de Sá Carneiro e pelo trabalho dos deputados da ala Liberal da Assembleia Nacional do anterior regime.

A história diz-nos que a maioria das vezes que o centro e a direita governaram Portugal foi em coligações entre o PSD e o CDS, mas é bom não esquecer que a primeira vez que o CDS chegou ao poder, 4 anos após o 25 de abril, foi numa coligação com o PS, num Governo de Salvação Nacional, urdido por Amaro da Costa e Mário Soares perante a eminência de uma bancarrota. É evidente que a realidade madeirense, como a açoriana, é distinta do que se passou no continente. Na Região, o PSD governa com maioria absoluta há 43 anos e o CDS tem um historial de oposição, sendo mesmo desde 2011, o principal partido da oposição. Para além disso, as relações entre as duas forças políticas sempre foram difíceis, em grande parte porque o PSD, que herdou a estrutura concelhia da Ação Nacional Popular na Madeira, sempre procurou a hegemonia do centro e da direita, não hesitando, muitas vezes, em perseguir e ostracizar militantes e dirigentes democratas-cristãos. É bom não esquecer esta situação, assim como devemos recordar que as primeiras coligações feitas na Madeira foram protagonizadas pelo CDS e o PS, em eleições autárquicas, numa tentativa de criar alternativas aos sociais-democratas. Temos, portanto, uma realidade muito diferente da nacional.

Se ideologicamente, o CDS sempre esteve mais próximo do PSD que misturou no seu Programa princípios da Doutrina Social da Igreja com ideias socialistas, a verdade é que, no caso da Região, o facto de o PS e o CDS estarem na oposição em condições muito difíceis, sem cumprimento do mínimo das mais elementares regras democráticas, levou-os a forjar uma resistência na oposição que nalguns casos envolveu até forças à esquerda dos socialistas, para não cairmos num regime de único partido. Ou se lutava ou se morria. Eu vivi e senti na pele o que foram esses tempos em que o PSD dominava praticamente tudo e todos e os oposicionistas eram tratadas como uns indigentes que serviam apenas para adornar o “regime democrático”. É por isso que se ideologicamente o CDS esteve sempre mais próximo do PSD, o partido esteve sempre estrategicamente mais próximo do PS. Foi isso que o líder do CDS quis transmitir.

É verdade que depois de o PSD ter perdido força eleitoral com a derrota na maioria das Câmaras e de na última legislatura, ter conquistado a maioria absoluta por 12 votos, as coisas mudaram, até porque também mudou a liderança do PSD, e Miguel Albuquerque encetou uma renovação que ficou a meio da ponte, mas atenção que os vícios do passado estão lá, persiste no PSD uma cultura de poder absoluto, com ocupação total do aparelho da administração pública e há feridas por sarar entre os partidos.

É igualmente certo que o PS na Madeira, fruto da sua vitória nas duas últimas eleições autárquicas, em particular no Município do Funchal e com a candidatura de Paulo Cafofo a Presidente do Governo, ganhou um novo élan para se apresentar como uma alternativa de poder na Região, embora as duas coligações que fez para ganhar o principal concelho da Região tenham ruído ao fim de algum tempo, o que demonstra uma instabilidade claramente preocupante; há um deslumbramento e uma arrogância de alguns dirigentes que afastam eleitores; não apresenta quadros credíveis; anuncia promessas irrealizáveis e aparece como um prolongamento da República na Madeira.

O CDS, como segunda força política mais votada nas regionais, não pode abdicar de ser alternativa e tem que ser equidistante de socialistas e sociais-democratas. O CDS não é muleta do PSD nem bengala do PS. O CDS é Alternativa à governação atual porque tem Programa, ideias e soluções diferentes dos outros partidos. Só depois do povo votar no dia 22 de setembro, é que se saberá quem ganha, qual o peso de cada partido e que convergências terão que ser feitas para formar o Governo Regional. O CDS deve fazer no dia seguinte às eleições aquilo que o povo, soberanamente, decidir no dia das eleições. Na certeza de que não havendo maiorias absolutas, o CDS não irá para o Governo a qualquer preço, não admite coligações com forças extremistas, não quer geringonças radicais na Região e lutará para que o seu projeto assegure uma terra de oportunidades para todos.