Crónicas

PIN, PAN, PUN...

1. Disco: António Zambujo é sempre bom de ouvir. Uma carreira consistente, sem concessões, bem estruturada. “Do Avesso” vira-nos ao contrário, enleva-nos. É um Zambujo diferente e, no entanto, inconfundível no modo como trata as músicas.

2. Livro: os acontecimentos últimos em França levaram-me a um pequeno livro de Sartre, talvez um dos seus menos conhecidos e falados, por ser um dos primeiros que escreveu. Tomou em português o nome de “O Pelotão de Execução” e teve uma única edição nacional, salvo erro. É praticamente um conto. Passa-se na Guerra Civil de Espanha e procura demonstrar a inevitabilidade de as coisas acontecerem como acontecem.

3. A situação em França, com as devidas e óbvias diferenças no conteúdo e no tempo, assemelham-se, cada vez mais, com o sucedido em Maio de 68. Principalmente, com a sua parte final e o seu desfecho. A destruição pela destruição.

A extrema-direita de um lado e, do outro, a extrema-esquerda, aos quais se associam os bandos dos “banlieue”, com o único objectivo de pilhar tudo o que lhes aparece à frente. As imagens e entrevistas televisivas provam isso à exaustão.

Não pretendo, com o que agora escrevo, retirar qualquer validade às justas reivindicações do cidadão comum que deu origem a este movimento sem chefes. Nem lá, nem cá.

A história não se repete, mas por vezes assemelha-se.

Em 1968 foi a destruição e a violência que assustaram a classe média que, em Junho seguinte, depois da segunda volta das eleições, deu uma maioria esmagadora aos partidos que apoiavam De Gaulle.

4. Trump e Erdogan já falaram, lançando avisos a Macron. Só faltam Orban e Putin. Quando isto acontece...

5. Escreveu o Pedro Nunes, no JM, que perdeu a fé neste país. Subscrevendo todas as razões que o levam a deixar de acreditar, mas eu recuso-me a perder a fé. E não o faço por achar que, no actual estado de coisas, estejamos às portas da salvação. Não estamos.

Recuso-me a perder a fé em nós, porque isso é perder a fé em mim. Ou, pelo menos, parte dela. Acredito que a capacidade de mudar está em todos e em cada um. E isso só é possível exercendo a democracia e a cidadania. Ficar em casa a mandar bocas e a dizer mal de tudo e de todos nas redes sociais, deixou de ser opção.

Já nem é uma questão de estarmos fartos disto tudo. É uma questão de querermos, efectivamente, mudar isto tudo. Não estou a referir-me exclusivamente a questões de participação na vida política, seja nos partidos seja fora deles. Estou a referir-me ao dever que cada um tem de exercer a sua cidadania. Reclamando, quando caso disso, nos locais próprios. Denunciando, não nas redes sociais, mas junto às autoridades, exercer o direito à associação de modo a que os interesses de todos sejam melhor defendidos. Perder o medo de dar a cara por aquilo em que acreditamos. Se há corrupção, que há, vamos dar cabo dela. Se o compadrio e o nepotismo estão instalados, vamos acabar com eles. Se estamos fartos da politiquice da partidocracia vigente, vamos correr com ela daqui para fora.

Há outros modos e maneiras de fazer as coisas. Os bons exemplos, por esse mundo fora, são muitos. Não podemos é persistir na queixa sem tomar acção. É tempo de mudar.

6. De resto, é a parvoíce do costume por todo o lado. O presidente do Eurogrupo, Mário Centeno, pediu ao ministro das Finanças português, Mário Centeno, medidas adicionais para cumprir o Pacto de Estabilidade.

Ficámos todos a saber que Mário Centeno tem um heterónimo: Mário Centeno.

Confuso? Não fique. Não vale a pena.

7. Na Assembleia da República são casos, de quinze em quinze dias. Ele foi alguns deputados das ilhas a receberem duplo subsídio para as viagens. Foram as moradas falsas, para receberem mais umas migalhas de deslocação. Depois, as falsas presenças permitidas por colegas que os tornam ubíquos. E, para fim de conversa, temos as votações falsas.

Mas quem pensa que isto fica por aqui, desengane-se. Se, por um lado, Ferro Rodrigues critica deputados que “põem em causa o prestígio da democracia”, por outro, tenta abafar um relatório do Tribunal de Contas que dá conta de inúmeras irregularidades na gestão orçamental da AR.

8. O ponto anterior lembrou-me uma coisa que escrevi aqui há tempos: entre um “NAMASTE” e um “MAMASTE”, vai a diferença de uma letra e um mundo inteiro de intenções.

9. A Iniciativa Liberal propôs aos restantes partidos que, durante a “Festa”, retirassem a sua propaganda que se encontra espalhada pela cidade. Não faz sentido nenhum gastar mais de um milhão de euros em luzes para embelezar o Funchal e, depois, no meio de tamanho investimento, persistirem cartazes a questionar ou a afirmar quem cumpriu com o quê. É feio. É ridículo.

10. E já estão marcadas todas as eleições de 2019: Europeias a 26 de Maio, Autonómicas a 22 de Setembro e Legislativas a 6 de Outubro. O importante é participar. Votando seja lá em quem for ou como for. Ir às urnas é um acto de participação e quantos mais lá formos menor é a abstenção e maior a nossa maturidade democrática. Num partido, branco, nulo, todas as opções estão em aberto. Usem-nas!

11. Do que a Autonomia precisa, neste momento, não é de sucessão, é de secessão. Secessão com o passado, secessão com as dependências diversas, secessão com lideranças monocromáticas e messiânicas. Precisa de ar fresco e de novos olhares. Precisa, urgentemente, de quem queira e saiba estar na política e não de quem a queira ser. Precisa de liberalismo e modernidade. De viver liberdade. De ser futuro.

12. O PAN quer alterar os provérbios com animais. Para quem não sabe, um provérbio é um dito da tradição popular que procura resumir um conceito ou uma norma social. Porque se baseia no senso comum, torna-se comummente aceite por todos. Quer dizer, por todos não. Um partido, povoado por irredutíveis defensores dos animais, resiste aos provérbios. E a vida não é nada fácil para os seus militantes nos campos fortificados de Cavalum Dadum, Carneirum Capadum, Burrum Velhum e Cada Macacum.

13. “Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta. (...)” – Guerra Junqueiro, 1896.