Crónicas

O Indignómetro

1. Disco: Eu não conhecia os “The 1975” de lado nenhum e daí, e, em modo de presente de Natal, esta indicação vai dedicada aos que acham que me chateiam quando se referem, pejorativamente, ao facto de eu pôr, por aqui, sugestões de música e de livros. Não me chateiam em nada e só provam que me lêem. E, só por isso, fico satisfeito.

O disco chama-se e tão a propósito, “A Brief Inquiry Into Online Relationships”.

2. Livro: um bom livro para esta época: “Deus, uma Biografia” de Reza Aslan. De como, em nós, transportamos algo de divino.

3. Indignómetro 1: Epá, desculpem se estas coisas que acontecem com regularidade na Europa com malucos aos tiros, a torto e a direito, me chocam e acho que são ataques muito bem direccionados ao nosso modo de vida.

Epá, desculpem se ofendi alguém quando fiquei chocadíssimo com a imagem da criança síria morta numa praia turca. Eu sei que também devia ficar chocado com as crianças do Darfur, e da Nigéria, e de aqui mesmo, eu sei... e fico.

Epá, desculpem se eu fui e sou Charlie, porque entendo que a liberdade de expressão não deve ter limites. Eu sei que devia ficar chocado com os atentados à liberdade de imprensa, e não só, que proliferam por esse mundo fora, inclusive entre nós. Eu sei... eu fico.

Epá, desculpem se saio do sério com as decapitações e abusos aos direitos humanos do Daesh, porque acho que a inviolabilidade da vida humana é sagrada. Eu sei que os israelitas matam palestinianos e os palestinianos tentam responder na mesma moeda e que a correlação de forças é desproporcional. Eu sei... eu fico.

Epá, desculpem se não consigo ficar calado, como vocês ficam porque não entendem que ao me revoltar com este ou aquele caso, em concreto, encerro neles todos os outros que me revoltam, que comigo mexem e que são menos mediatizados.

Epá, desculpem se, como muitos de vós o fazem, não consigo passar o dia a fazer uma lista de tudo o que devia falar, e não falo, só falando dos casos com que a média abre noticiários e faz primeiras páginas.

Epá, desculpem se, de repente, um simples caso me faz transbordar a garrafa da indignação.

E, a alguns, as minhas desculpas porque penso e tenho a minha opinião. Que pode ser diversa da vossa, mas é minha.

E se querem reciprocidade, respeitem-na.

4. Querer autonomia da Madeira em relação a Lisboa e centralismo do Funchal em relação aos municípios é coisa sem pés nem cabeça.

5. Noticiou, na passada semana, o DN que a dinamarquesa “MAERSK”, a maior empresa mundial de transporte marítimo de contentores, e a “Oldendorff”, outro gigante nos transportes via marítima, estão de saída do MAR. Tudo porque o incompetente Ministério do Mar, de Ana Paula Vitorino, não cria regulamentação legal de modo a que os navios registados no nosso centro possam ter guardas armados a bordo para poderem resistir aos ataques da pirataria internacional. Era pôr a senhora ministra, e os seus colegas, a bordo de um navio cargueiro que tivesse que passar em frente à Somália, armado com uma pistola de alarme, a ver se não mudavam de ideias num instante. Não ter ainda resolvido este assunto, é de uma incompetência a toda a prova e de uma enorme maldade e sacanice, pela importância que tudo isto implica na segurança de bens e pessoas e pelo que representa em termo de recursos que o MAR vai perder, perdendo assim a Madeira, de arrasto. Depois, não digam que não é de propósito.

6. Indignómetro 2: Epá e tal e vão ao supermercado e enchem sacos com coisas para o Banco Alimentar e, depois, no resto do dia, não pensam nos que passam fome e coisa e o carrinho do supermercado tem falta de óleo nas rodas e o queijo que cheira a chulé aumentou de preço e se há gente a passar fome na Síria também as há no Tchipigumbondo. O melhor, era ficarem em casa.

7. E, no Brasil, uma das novas ministras de Bolsonaro disse: “eu tive a minha experiência com Jesus num pé de Goiaba”...

Eu também já subi a um pé de Goiaba, mas aquela porcaria não aguentou com o meu peso e partiu-se. Marrei com a cabeça no chão. Não vi Jesus, mas vi estrelas. Será que também serve de experiência mística?

Eu sei que não vale nada, mas enquanto estes malucos estiverem no poder no Brasil eu não ponho lá os pés...

8. Diz o “bom” do Antonoaldo que se pede aos passageiros que estes avaliem a qualidade do serviço, quando usam a TAP. Este ano, e desde que o Antonoaldo é o chefe da pandilha, já voei umas vezes na companhia e ninguém me perguntou nada. Será que, à saída do avião quando as/os assistentes nos agradecem e replicamos ao “obrigado” com um educado “de nada”, isso conta como avaliação?

Pergunto aos meus amigos que tenham viajado este ano na TAP, se lhes perguntaram alguma coisa quanto à sua satisfação...

Chega de Antonoaldos e de desconsiderações. Alguma coisa tem de ser feita de modo a que manifestemos a nossa indignação com as declarações do presidente do conselho de administração da TAP. Quinhentos e mais euros por uma passagem para vir passar o Natal na Madeira, são “fake news”? BASTA.

9. E a propósito de indignação, aqui vai o Indignómetro 3: epá e tal e vão à Missa do Parto e depois no resto do dia já não ligam a Deus e coisa e o menino Jesus nas palhinhas e a Mãe dele e é só naquele pedaço que se dão à religião. O melhor era ficarem em casa.

10. O poder de compra, em Portugal, volta a baixar e está pior que antes da crise. Menos impostos directos, mas mais impostos indirectos é mais dinheiro no bolso? Cá nada. É só mesmo a continuação da austeridade disfarçada de socialismo.

11. Numa troca de ideias no Facebook, escrevia o Pedro Fontes, a propósito de uma publicação sobre a recuperação irlandesa, quando comparada com a nossa: “Nós preferimos a paz social das corporações à aposta no crescimento.”

Eu, acrescento, concordando completamente com Pedro: tivemos 48 anos de ditadura que criou e se sustentou nas corporações e continuamos com mais 44 anos de corporativismo que não acabou em Abril de 74.

A pequenez, o pequeno interesse do grupelho, a cupidez, o tomar o poucochinho como o todo, o apoio e conivência política com este estado de coisas.

92 Anos de corporativismo e queremos um país evoluído economicamente? 92 Anos de defesa de interesses umbilicais e marimbando-se para o bem comum?

Obviamente que assim nunca chegaremos a lado nenhum.

12. E termino com o Indignómetro 4: ah e tal e coisa e agora põem a fotografia da estreia de “O Regresso de Mary Poppins” e na Camanalância tem um gajo que é primo que se cortou a fazer a barba e as crianças do Caganalatistão não vão poder ver a estreia do filme... e o raio que os parta!

13. E se repararam, nem sequer me indignei com os copos do Calaça e o auto-amor do Avelino. É muito.

14. “A esperança tem duas filhas lindas, a indignação e a coragem; a indignação ensina-nos a não aceitar as coisas como estão; a coragem, a mudá-las” – Santo Agostinho