Crónicas

Autómatos, mas nem tanto...

Há uma clara desarmonia entre o que são as vocações dos jovens, o que é a oferta de cursos, o que as empresas precisam e os avanços tecnológicos que estão a mudar a sociedade

Metade da população da Madeira só tem o 9º ano de escolaridade e a situação tem a ver com o abandono escolar precoce que tardamos a erradicar; muitos empregos estão por preencher na Região porque há uma desconformidade entre a formação dos desempregados e as necessidades do mercado de trabalho e falta uma requalificação desses recursos humanos; a economia digital que está aí instalada vai acabar com muitos empregos e é necessário reconverter os trabalhadores e quadros que têm as suas profissões e as suas carreiras em risco; a automação da produção laboral está em marcha e muitos postos de trabalho serão extintos e teremos que criar outros para que não se assista a convulsões sociais; a mãe de todas as desigualdades é a desigualdade do conhecimento que levas às outras diferenças, nomeadamente às disparidades socioeconómicas. Estas são realidades que, por vezes, nos passam ao lado e que os Governos tardam em encarar, mas que muitos cidadãos já sentem na sua vida.

A primeira questão que deve ser tratada é a do sistema educativo. Há uma clara desarmonia entre o que são as vocações dos jovens, o que é a oferta de cursos, o que as empresas precisam e os avanços tecnológicos que estão a mudar a sociedade. Sem perder o caracter universal da formação integral do individuo temos que caminhar para um sistema de ensino dual, conjugando conhecimentos teóricos com competências adquiridas em contexto de trabalho. As escolas e as Universidades devem fornecer informação às famílias e aos alunos sobre as competências e oportunidades, adaptar os currículos e criar cursos para a aprendizagem ao longo da vida profissional.

A segunda grande questão é a automação do trabalho com a inteligência artificial, a revolução digital e a robótica a criarem um mundo novo que não se sabe onde vai parar e que cria inúmeros desafios para os quais temos que dar respostas.

Um estudo recente da Confederação da Indústria Portuguesa (CIP) elaborado em parceria com o McKinsey Global Institute e a Nova School o Business and Economics, indica que até 2030, ou seja, em 10 anos, vamos perder em Portugal mais de 1 milhão de postos de trabalho devido à automação dos processos de trabalho, sobretudo nas áreas da indústria transformadora e do comércio. Por outro lado, na próxima década, a automação poderá compensar esse desemprego, criando entre 600 mil a 1 milhão de empregos, mas nos setores da saúde, assistência social, ciência e profissões técnicas, algumas que ainda não existem. Finalmente, 700 mil trabalhadores necessitarão de melhorar as suas competências ou mudar de emprego até 2030. Os especialistas recomendam que a requalificação laboral só será possível com o fomento do empreendedorismo e o crescimento económico, o investimento no capital humano, designadamente na qualificação ao longo da vida, no dinamismo e flexibilidade do mercado de trabalho e nos apoios à transição dos trabalhadores para outras profissões. Tarefas para serem realizadas, em articulação, pelos Governos, Educadores, Empregadores e Funcionários.

Pese embora todos os receios, admite-se que a automação poderá acelerar o crescimento da produtividade e, consequentemente, manter os níveis de crescimento do Produto Interno Bruto. O estudo conclui que metade do tempo despendido em tarefas de trabalho, já hoje, é suscetível de ser automatizado recorrendo à tecnologia atual, mas perspetiva que a longo prazo a automação poderá criar o emprego suficiente, já que aparecerão novas necessidades e profissões. Avisam os especialistas que o processo de transição poderá ser doloroso, dadas as divergências entre a oferta e a procura no mercado de trabalho, e daí que proponha uma avaliação profunda das implicações da automação na economia e a execução de ambicioso plano de requalificação e reconversão dos recursos humanos para que se encontre um estado de equilíbrio que evite desfasamentos e perturbações sociais.

Estas conclusões são válidas para a Região, mas dadas as particularidades das economias da Madeira e do Porto Santo, temos que estudar, seriamente, o impacto que a automação terá no mercado de trabalho, para não virmos a lamentar os chamados desempregados tecnológicos que já são visíveis na nossa sociedade, assim como temos que adaptar o sistema educativo à nossa realidade e combater, também, outras distorções como a dos jovens altamente qualificados que não conseguem encontrar uma primeira oportunidade de emprego em função da sua formação ou das licenciaturas que foram “obrigados” a terminar pelo nosso ensino superior.