Crónicas

A FESTA não é de todos

Hoje, já se põe em causa a sustentabilidade do sistema de pensões e reformas e se os que começam agora a trabalhar terão acesso a esses apoios, daí a necessidade de cada um começar a pensar, desde muito cedo, num “pé de meia” para a velhice.

Estamos em Festa, mas muitos idosos estão a passar este Natal nos Hospitais, apesar de terem alta e poderem estar em casa ou num lar. Para eles a Festa da Família já era e, agora, resta-lhes esperar pela morte que pode vir pela velhice ou por via de uma infeção hospitalar. É triste e deprimente, mas é a realidade que estamos a atravessar, fruto de um crescente egoísmo que grassa na nossa sociedade. Os que deram tudo aos seus filhos e netos, estão agora confinados a uma cama de hospital e a Festa já não é para eles. Resta-lhes a “família hospitalar” e o carinho dos profissionais de saúde que tudo fazem para que eles sintam um pouco menos de solidão.

O problema é complexo, e as suas causas e consequências são variadas. Os governos não olharam para a demografia no tempo certo, não atenderam ao envelhecimento da população que estava à vista de todos; e não construíram uma rede de apoio social aos idosos que precisam cuidados de saúde e que recebem pensões e reformas muito baixas. Só na Madeira, temos cerca de 600 idosos abandonados nos hospitais, apesar de terem alta clínica (vulgo altas problemáticas), com custos altíssimos para o orçamento e funcionamento do Serviço de Regional de Saúde e temos mais de mil idosos à espera de serem acolhidos num lar. Não houve investimento suficiente nesta área na Região e as consequências são altamente negativas.

As famílias dividem-se entre aquelas que procuram por todos os meios manter os seus seniores nas suas casas; aquelas que pelas ocupações profissionais dos seus membros têm dificuldade em acompanhar a velhice dos seus progenitores; aquelas que estão desestruturadas e que tendo poucos membros não conseguem acolher os seus idosos e aquelas que, simplesmente, estão se marimbando para quem lhes deu a vida e optam por deixar os velhos nos hospitais entregues nas mãos do “Estado”. Algumas até arranjam esquemas para ficarem com a pensão ou a reforma dos idosos. O que me choca é que estas últimas, aproveitem, precisamente, um tempo de Natal e de Festa, para largar os seus mais velhos nos hospitais, cerca de 20 por semana nos últimos tempos.

O CDS tem vindo a propor a criminalização do abandono dos idosos e, mais tarde ou mais cedo, vamos ter que ir por esse caminho, apesar da oposição das esquerdas que, estranhamente, encetam lutas sem tréguas, e bem, pela defesa e proteção dos animais e se esquecem dos seres humanos. Mas não chega “castigar” quem abandona, é preciso saber por que o fazem e atacar as causas.

Em primeiro lugar, urge uma Política de Família integrada do nascimento até à morte, que valorize e faça interagir todas as faixas etárias do agregado e que apoie fiscalmente quem cuida e mantêm os seus mais velhos no seio familiar. Em segundo lugar, é necessário reforçar a ajuda domiciliária e incentivar o cuidador informal, sobretudo para os idosos que vivem sozinhos ou cujos familiares estão a trabalhar. Em terceiro, é preciso investir em Centros de Dia e de Noite para ajudar os nossos maiores a combater a doença, o isolamento e a insegurança. Em quarto lugar, é urgente construir uma rede de lares e residências assistidas pela ilha para os seniores que não têm família ou esta já não os pode manter em casa. Em quinto, alargar a todo o arquipélago a Rede de Cuidados Continuados para aqueles que, tendo alta médica, ainda precisam de cuidados de enfermagem ou de recuperação na transição hospital-casa e neste âmbito importa, desse já, estudar a integração do atual Hospital Dr. Nélio Mendonça na Rede, quando a nova unidade hospitalar estiver em funcionamento. Em sexto, revalorizar o papel dos mais velhos e dos avós na nossa sociedade, tendo políticas ativas de envelhecimento e pondo os seus conhecimentos ao serviço dos mais novos. Finalmente, em sétimo lugar, penalizar social e fiscalmente, aqueles que beneficiando de pensões e heranças, abandonam os mais velhos. Obviamente que todas estas medidas exigem um grande esforço financeiro das Administrações Públicas e da Segurança Social, mas são tarefas inadiáveis, sob pena de estarmos a construir uma terra que ao mesmo tempo que dá mais anos aos mais velhos, retira-lhes qualidade e dignidade de vida. Cuidar do envelhecimento da população deve ser uma das principais prioridades do próximo Governo Regional.

A própria forma como encaramos a velhice tem que mudar, e as pessoas de meia idade e os jovens têm que pensar mais cedo, e de outra forma, o dia em que chegarão à terceira e à quarta idade. Hoje, já se põe em causa a sustentabilidade do sistema de pensões e reformas e se os que começam agora a trabalhar terão acesso a esses apoios, daí a necessidade de cada um começar a pensar, desde muito cedo, num “pé de meia” para a velhice. Como diz o povo “ninguém vai para novo”.