Crónicas

A Europa é nossa

Nas últimas eleições europeias, dois terços dos cidadãos na Madeira e no país, não foram votar, naquela que foi a maior abstenção registada em Portugal

Estamos a três semanas das eleições europeias, talvez as mais decisivas desde que elegemos deputados ao Parlamento Europeu. O que seria do desenvolvimento da Madeira e do Porto Santo, do crescimento económico, da criação de empresas e de emprego e da geração de riqueza nas nossas ilhas, sem as vultuosas verbas que recebemos da União Europeia? É verdade que ainda temos muitos problemas, imensos constrangimentos económicos, dificuldades nos transportes, grandes desigualdades sociais, largo desemprego, mas estamos bem melhor do que estávamos em 1986, aquando da integração europeia. Uma boa parte da infraestruturação da Região, nomeadamente da rede viária e da criação das condições básicas da vida das populações, foi realizado com dinheiros europeus. Nestes 33 anos, recebemos 3.860 milhões de euros, decisivos para a transformação das nossas ilhas, qualquer coisa como o equivalente a sete ampliações do aeroporto da Madeira!

Foi a partir de 1988, na Cimeira de Rhodes, na Grécia, que se introduziu no pensamento europeu o conceito de ultraperiferia, para além da insularidade, e daí para cá as regiões mais afastadas do centro da Europa, têm vindo a ter ganhos de causa e de apoio a cada Quadro Comunitário da União. Este reconhecimento jurídico e político da realidade destas Regiões foi feito em 2010 com a inscrição de um artigo próprio e densificado no Tratado Europeu, uma espécie da Constituição Europeia. O que está estipulado é claro: “Tendo em conta a situação social e económica estrutural da Guadalupe, da Guiana Francesa, da Martinica, da Reunião, de Saint-Barthélemy, de Saint-Martin, dos Açores, da Madeira e das ilhas Canárias, agravada pelo grande afastamento, pela insularidade, pela pequena superfície, pelo relevo e clima difíceis e pela sua dependência económica em relação a um pequeno número de produtos, fatores estes cuja persistência e conjugação prejudicam gravemente o seu desenvolvimento, o Conselho sob proposta da Comissão e após consulta ao Parlamento Europeu, adotará medidas específicas destinadas em especial, a estabelecer as condições de aplicação dos Tratados a essas regiões, incluindo as políticas comuns” e mais à frente estabelece-se que as medidas “...incidem designadamente sobre as políticas aduaneira e comercial, a política fiscal, as zonas francas, as políticas nos domínios da agricultura e das pescas, as condições de aprovisionamento em matérias-primas e bens de consumo de primeira necessidade, os auxílios estatais e as condições de acesso aos fundos estruturais e aos programas horizontais da União”. Temos aqui um enorme caminho a percorrer, aprofundando e executando na prática o que já está consagrado na Lei Fundamental da União.

É obvio que ainda estamos muito longe de alcançar um verdadeiro Estatuto da Ultraperiferia que dê corpo e músculo ao que está plasmado no Tratado, mas progressivamente as instituições europeias vêm desenvolvendo jurisprudência a favor das regiões, pese embora alguma resistência de alguns Estados Membros, em particular os do Norte, curiosamente os mais ricos da Europa.

Tudo indica, pelas posições já tomadas no Parlamento Europeu, que o novo quadro legislativo e financeiro pós 2020 vai respeitar, na sua plenitude, o que está estabelecido no artigo 349 e que o próximo Quadro Financeiro Plurianual deve manter as políticas de Coesão e de Solidariedade destinados às Regiões Ultraperféricas, nomeadamente a taxa de cofinanciamento de 85 por cento nos projetos apoiados, a manutenção dos programas de apoio à agricultura e às pescas e os subsídios ao abastecimento dos produtos essenciais que importamos. São mais alguns motivos para irmos votar, mas há outros de grande alcance que convém não esquecer: temos que revitalizar o Projeto Europeu que nos deu 75 anos de Paz no Continente, após duas sangrentas guerras mundiais; devemos contribuir para evitar uma desagregação da União de que o Brexit do Reino Unido é um exemplo; podemos travar o crescimento dos populismos e dos extremismos que ameaçam correr por dentro a União; estamos obrigados a defender o mercado único e a livre circulação de pessoas e bens; queremos reforçar o Euro e torna-lo mais forte; precisamos de acentuar o peso da União Europeia no contexto mundial, aproveitando também a projeção oceânica das suas ilhas e das regiões ultraperiféricas.

Nas últimas eleições europeias, dois terços dos cidadãos na Madeira e no país, não foram votar, naquela que foi a maior abstenção registada em Portugal, sendo que nos Açores assistiu-se ao escândalo de 80% dos eleitores não terem ido às urnas. Desta vez não pode ser assim. Como é que podemos exigir mais fundos europeus se não damos importância à União Europeia e às suas eleições? Como é que os nossos eleitos têm força para negociar novos apoios se não lhes damos legitimidade eleitoral? Como é que os Governos Central e Regional podem defender os nossos interesses se as pessoas não se interessam pela vida da União? Vamos todos votar porque a Europa é Aqui e também é Nossa.