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Turismo e paisagem

Que interesse poderá, todavia, despertar a paisagem da ilha a essa crescente multidão de gulosos que viaja para provar a chamada cozinha regional?

Costuma-se dizer que os turistas visitam a Madeira para se encantar com a sua paisagem, seja ela a da floresta Laurissilva, a dos socalcos cultivados ou a das suas vilas e cidades. É verdade. Mas existem também aqueles que a visitam atraídos, sobretudo, pela amenidade do clima, que foi, aliás, o maior atractivo nos tempos em que a Madeira era estância de cura para a tísica ou para outras maleitas pulmonares. Porém, o clima (os nevoeiros que coroam os cumes das montanhas e o sol que se reflecte nas suas vertentes) também é paisagem e, a comprová-lo, estão as abundantes e belíssimas representações que dessa luminosa atmosfera fizeram os pintores e fotógrafos que visitaram o arquipélago nos últimos dois séculos.

Que interesse poderá, todavia, despertar a paisagem da ilha a essa crescente multidão de gulosos que viaja para provar a chamada cozinha regional? Aparentemente, nenhum. Acontece, porém, que talvez sem o saberem, o que estes comilões estão a saborear (ou melhor: poderiam estar a saborear, não fosse o abandono da agricultura e a avassaladora importação de géneros que inundam os mercados insulares) é precisamente a paisagem da Madeira: vinhos, frutos, peixes, crustáceos, isto é, os sabores únicos de uma terra cultivada em socalcos e de um mar abissal. A paisagem é, portanto, literalmente comestível.

É claro que entre os muitos turistas atraídos pela a ilha há também os adeptos dos desportos radicais: downhill, canyoning, hard trekking, etc. À partida, dir-se-ia que para estes intrépidos aventureiros, o interesse pela paisagem é limitado, já que o que os move é a relação que tecem a sua própria estrutura musculoesquelética, relação que tanto se pode consumar num aparelho de ginástica como em qualquer vertente montanhosa. Puro engano! As avassaladoras emoções do desporto radical, confessou-mo um dia, na sala de espera do ortopedista, um adepto de downhill, nunca são as mesmas, variam consoante a paisagem!

Vem tudo isto a propósito do Congresso Mundial sobre Territórios em Socalcos, este ano focado na Macaronésia, em que a Região participou através do recém criado Observatório da Paisagem da Madeira e das organizações nele representadas. Entre os temas abordados, como seria de esperar, a paisagem acabou por ocupar um papel central. Ora, se os turistas viajam para se encantar com a paisagem, em que medida pode a sua presença contribuir para que esta se sustente ou renove de uma forma equilibrada? A esta pergunta crucial, muitas respostas foram dadas. Aguardemos, pois, pelas conclusões que brevemente serão publicadas.