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Personalidades do ano

“Eu sou o João Verdinho/ Amigo de toda a gente / Gosto da Natureza e do Bom Ambiente”: era este o início da publicidade institucional dirigida a crianças, transmitida nos anos 90, pela RTP-Madeira. Possivelmente embalada pelo sucesso do formato “Vitinho”, o objetivo aqui não era mandar a criançada dormir, mas sim sensibilizá-la para a importância da conservação da natureza. A mensagem era clara: o meio ambiente corria perigo e tinha de ser protegido. Não percebia bem porquê, nem bem como, mas sabia que de uma maneira ou de outra, eu também era importante nesta defesa. Não devo ter sido caso único e aposto que muitos dos agora leitores concordarão comigo.

Lembrei-me do João Verdinho a propósito das reações negativas que se começam a sentir em relação à pequena Greta Thunberg. Dizem que representa lobbies, que deveria estar nas aulas e que deveriam ser os entendidos sobre as alterações climáticas a falar sobre tema. Tirando a parte em que estes especialistas falam há anos e ninguém lhes liga, a pequena Greta nem diz o contrário. Que não se aprecie o seu estilo algo alarmista é uma questão de gosto, mas que se desvalorize a sua verdadeira mensagem e se destile ódio por uma jovenzinha de 16 anos é preocupante. O combate ao aquecimento global não pode continuar a ser visto como uma fantasia da esquerda, dos adolescentes e dos hypsters. Basta ver as publicações nas redes sociais plenas de regozijo, de mergulhos no mar em dezembro ou fevereiro, normalmente acompanhadas de declarações de amor eterno à nossa ilha. Ninguém põe em causa o amor eterno e até acho bem, mas já o sol tão quente naquela altura do ano deve ser questionado. Não combater o aquecimento global já é mau o suficiente. Não é necessário celebrá-lo. É claro que não fazem por mal, mas é sintomático da falta de importância que se atribui ao tema.

Creio que há um sentimento quase generalizado de que tudo há-de resolver-se. Ninguém sabe bem como, quando ou quem, mas tudo há-de acabar em bem, qual sina do destino. Como se o problema não fosse bem um problema, ou como se a natureza fosse por si própria encontrar uma solução. E isso, creio eu, explica a passividade.

Nós, por cá, por estarmos no meio do oceano, sentimos especialmente os efeitos das alterações climáticas. São os incêndios, são as enxurradas e são os ventos. Os efeitos estão à vista de todos e se não se devem às alterações climáticas, a que se deverão afinal? É certo que o planeta terra já passou por vários períodos de arrefecimento e aquecimento, mas eram alturas em que a intervenção do homem era diminuta. E sejamos honestos e razoáveis: tantas emissões de dióxido de carbono para a atmosfera, têm de estar a fazer mossa nalgum lado.

Há sinais positivos, nomeadamente nas agendas políticas e governativas e no caso da Região Autónoma da Madeira, há a intenção assumida de continuar o processo de preservação e alargamento das áreas protegidas, marítimas e terrestres.

É também crucial que esta temática não seja encarada como uma luta da esquerda ou da direita. Muito menos uma luta da esquerda contra a direita. Haverá sempre alguma instrumentalização, mas há que ver por cima de tudo isso. Já há quem defenda que não vamos a tempo de reverter a situação, portanto não nos percamos com distrações.

A nível legal e jurídico, tem havido alguma evolução, nomeadamente com a publicação da Lei n.º 56/2011, que veio alterar o crime de incêndio florestal e os crimes de dano contra a natureza e de poluição, alargando o seu âmbito de aplicação e tipificar um novo crime de atividades perigosas, destinado à proteção da camada de ozono. Mas é preciso mais, muito mais, sobretudo a nível preventivo.

E aqui, a pequena Greta, tal como o pequeno João no seu tempo, tem tido um papel fundamental na consciencialização e sensibilização das pessoas, sobretudo dos mais jovens, para a preservação do meio ambiente. Papel esse, que acaba de lhe valer a nomeação de personalidade do ano, pela revista norte-americana Time, sendo a mais nova da história a conseguir esta distinção. Na preservação da natureza todos os atos contam e que sejamos todos nós, mesmo sem distinção, personalidades do ano. Todos os anos.