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Os desafios da Europa

Quando termina a campanha eleitoral para as eleições Europeias estamos no centro de uma grave crise global, que não quisemos ver chegar. É, por isso, importante procurar respostas para pôr fim aos erros cometidos nos últimos anos.

De facto, uma Europa mais livre e solidária tem de ter líderes à altura da tarefa. Homens que não se curvem perante o deslumbramento do poder e para quem a causa pública esteja acima de todas as outras.

A crise actual não se limita a um ou dois países, nem a um ou outro sector: é uma crise ampla e que afecta todo o ocidente. Em tempos como o que vivemos, é fundamental uma liderança forte, sólida e credível, que defina um novo rumo. Em pleno descrédito das políticas e das instituições é essencial a definição de novos caminhos, tendo como base os ensinamentos do passado. É indispensável encontrar soluções para podermos caminhar para uma Europa diferente, mais solidária e justa, uma Europa que saiba reconquistar o seu papel no mundo e não se converta numa parte insignificante do continente euroasiático.

Tudo isto coincide com outro fenómeno político inquietante. Por definição, a política é a preocupação com a polis, com o que ocorre nas pessoas, na cidade, entendida em sentido amplo, na comunidade a que se pertence, seja esta local, nacional ou, mais abrangente, dos seres humanos naquilo desde há décadas se entendeu chamar a “aldeia global”. Talvez seja inevitável, mas está a notar-se, tal como noutros sectores da sociedade, que o espaço para política, exercida como um compromisso pessoal e respeitável e com outras condições prévias, está a reduzir-se muito.

Nesse contexto preocupante, responde-se principalmente com duas atitudes por parte dos cidadãos desta “aldeia global”. Uma muito minoritária de fundamentalistas marginais que proclamam a verdade e com ela nos atingem na cabeça, porque acreditam que a sua verdade é absoluta e não compatível nem transferível: ou acreditas nela ou não, mas sem meias tintas.

Esse é um fenómeno à escala mundial, muito ligado por exemplo às expressões do nacionalismo exacerbado de todo o tipo, alguns de carácter religioso, outros de carácter cultural ou étnico, dos populismos de diversa ordem e com frequência misturados com interesses económicos.

Por outro lado, há um número crescente de cidadãos que mostram uma espécie de relativismo curto de compromisso. Gente que parece que está a voltar de algum lado, mas sem ter ido a parte alguma: “ A vida é curta para ir, desconfiem dos que vêm de volta”. Esse relativismo estende-se muito pelo mundo. A escassez de compromisso costuma ser distanciada e muito cínica, e o trabalho convertido em grande medida numa actividade quase exclusivamente mercenária, em que o bom profissional aspira a que lhe paguem o máximo possível, a aí acaba tudo. A máxima retribuição possível, mas sem que ele se comprometa vital ou realmente com o seu trabalho, com o que fez durante boa parte do seu tempo.

Não é apenas um problema dos políticos, nem sequer fundamentalmente deles. A política reflete um estado de espírito geral e, como vimos antes, é cada vez menos comprometida e mais dependente de cada sondagem de opinião, mais in-mediática. Nesse contexto, o que me preocupa é que tenha deixado de haver um compromisso com um projecto para o próprio país, em que se acredite e que nem sempre há de desenvolver-se a favor da corrente, como acontece, por seu lado com qualquer outra actividade humana comprometida.

Muitos políticos interpretam a sua função pública em termos cristãos como um sacrifício, mas melhor seria que deixassem de sacrificar-se e oferecessem o lugar a quem viva com satisfação pessoal. Certamente, o esforço é enorme e o compromisso, se for levado a sério, produz insónias e muitas preocupações – lembrem-se dos meus cabelos brancos – mas é a melhor maneira de viver. Desconfiem sempre dos que já estão de volta.

Eu, ao menos prefiro estar sempre de ida.

O futuro da nossa sociedade dependerá do que formos capazes de mudar nas nossas atitudes, em especial dos jovens. E tais atitudes poderão mudar se os jovens compreenderem que o seu país, dentro de 15 ou 20 anos, será o que a sua geração quiser. Que serão eles a ocupar todas as esferas do poder: a política, a empresarial, a cultural... Se adoptarem um compromisso de qualquer tipo e o transmitirem sob a forma de solidariedade, mesmo que seja tácita, podem transformar o país. Podem transformar a Europa.

Não podemos esquecer que a sociedade civil é central para a vitalidade e a qualidade da democracia, tendo como principal um papel crucial no empoderamento das pessoas, nomeadamente as mais excluídas. A UE deve, por isso promover e proteger o espaço de acção das organizações da sociedade civil, assegurando a participação e o envolvimento efectivo das pessoas e o escrutínio democrático. A UE deve promover a participação cívica e democrática de todos os cidadãos e cidadãs, procurando incentivar uma política de sensibilização e educação para a cidadania global, com vista à erradicação da pobreza e injustiça social.

Em tempos de incerteza, de tensão e de crise é muitas vezes difícil de entender a importância da noção de comunidade. O Estado Social claudica, mas os direitos sociais têm de ser salvaguardados, através de um contrato social renovado como tenho vindo a defender nos últimos anos e como o fiz publicamente há três anos na Assembleia Municipal do Funchal. Só assim é possível uma melhor utilização dos recursos disponíveis e de aperfeiçoamento da justiça distributiva. A qualidade dos serviços públicos de interesse geral não deve ser posta em causa – educação, saúde e protecção social.

Há uma crise que percorre a Europa, Ela obriga-nos a repensar o significado da identidade plural do velho Continente. A avaliar as possibilidades de tantos Estados, Povos e Nações por partilharem algumas das tarefas de um destino, quer o queiramos ou não, cada vez mais comum.

A Europa vive hoje no labirinto da falta de respostas às ameaças globais que dão rosto à crise Europeia. Ameaças contra as quais a Europa tem de adoptar novos caminhos, ousando uma estratégia comum, fundada num novo realismo político, cujo centro de gravidade residirá na combinação entre as políticas do ambiente, cooperação para o desenvolvimento sustentável e defesa comum.

Há que reconhecer o fracasso e empreender um novo rumo. A Europa merece melhor.