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O lugar do Estado

A manter-se esta intenção, o Ensino Secundário deixará de estar presente em todos os concelhos, ficando reduzido a apenas quatro

1. Reduzir o Ensino Secundário a apenas duas escolas no Funchal, uma a leste e outra a oeste da ilha, e ainda outra no Porto Santo, é a intenção a concretizar lá para 2026, segundo declarações de responsáveis regionais de Educação, face à gradual diminuição de população escolar... À falta de melhor estratégia para contrariar a descida demográfica, a solução é extinguir este nível de ensino em alguns locais... Medida de política educativa a acrescentar à discutível extinção, perdão, fusão de escolas públicas... Aos ouvidos ainda nos soam os discursos de congratulação, aquando de tantas inaugurações de escolas por essa ilha fora, algumas de duvidosa necessidade... E agora, em localidades marcadas por crescente despovoamento, decide-se encerrar o Ensino Secundário, esse reconhecido patamar mínimo de escolaridade e modernidade educativa, consagrado na Lei de Bases do Sistema Educativo, consensualmente aceite da direita à esquerda... E numa região onde mais de metade da população ativa não vai além do 3º ciclo do Ensino Básico...

A manter-se esta intenção, o Ensino Secundário deixará de estar presente em todos os concelhos, ficando reduzido a apenas quatro. É claro que hoje há muitas vias rápidas e facilmente as pessoas poderão deslocar-se, argumenta-se. Já não estamos na Madeira de antigamente, quando só quem podia pagar colégio interno, moradia alternativa, ou tinha familiares a viver perto da cidade, podia seguir estudos. Não deixa de soar, todavia, a um entrave ao direito universal à Educação, uma das responsabilidades do Estado, consagradas na Constituição. Seguir-se-á o encerramento de outros serviços públicos, centros de Saúde, repartições públicas? É certo que cada vez temos menos crianças... Diminuem os nascimentos... Pelo menos nos espaços rurais... Sobram casas que vão ficando vazias de novos que, à falta de perspetiva de futuro partem em busca de rumo. Os velhos vão ficando até à demanda da etapa final da vida... Parece ser mais simples abdicar da escola... Menos despesa pública? Não se sabe a opinião de autarcas destas zonas sobre esta matéria, nem se terão sido consultados, mas não deixa de ser uma curiosa estratégia de desenvolvimento, ou repovoamento do desertificado espaço rural e da costa norte da ilha! Uma empresa privada não faria melhor...

2. Interessante é a indignação de certas figuras públicas face à degradação dos serviços de correios, com encerramento de estações, principalmente após a sua transformação de instituição de serviço público da responsabilidade do Estado, em empresa privada, na sequência da polémica venda efetuada pelo governo anterior. Que me lembre, (mas posso estar errada!), não vi essas mesmas figuras manifestarem-se contra essa decisão política; muito pelo contrário: tratava-se tão só de uma simples operação de liberalização de serviços, defensável para certos quadrantes da nossa racionalidade, onde o mercado podia operar e que traria, dizia-se, importantes lucros ao Estado. Atitude igual à liberalização do transporte aéreo para a Madeira, vão já dez anos: que era bom; que traria viagens baratas; que a concorrência entre as empresas transportadoras de e para o destino Madeira (uma urbe em termos populacionais igual a Nova Iorque!) faria baixar os preços dos bilhetes; e blá, blá, blá... A realidade está aí, com o direito à mobilidade refém das políticas de preços e das condições operacionais das transportadoras, acrescidas da meteorologia a que se junta a vergonhosa situação atual com a empresa concessionária do transporte aéreo para o Porto Santo...

3. Quando em causa está o acesso a direitos de cidadania nas diversas esferas de intervenção junto das populações, o lugar é do Estado; não há paciência para retórica parlamentar ou joguinhos políticos. Há questões que ultrapassam dicotomias doutrinais, ou espectros cromáticos. E quanto às sentenças de Salomão das entidades reguladoras estamos conversados...