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M87 mais do que a soma das partes

Recentemente oito radiotelescópios instalados à volta Globo recolheram as primeiras imagens, que proporcionaram um vislumbre de um buraco negro na Galáxia ‘Sagittarius A*’ (do Inglês “Sagittarius A-Star”), a 55 milhões anos luz de distância da Terra, com um tamanho 6.5 biliões de vezes maior que o nosso Sol. Foi inaugurada uma nova era da Astronomia moderna e confirmada uma das antevisões da teoria da relatividade de Einstein e da emissão da radiação de Hawking.

A imagem do M87 surgiu de um compósito de dados captados em simultâneo dos Observatórios do Chile, Havai, Europa, América do Norte, América do Sul e Polo Sul. O processamento dos sinais, que produziram a imagem, foi efetuado nos supercomputadores do ‘MIT – Massachusetts Institute of Tecnhology’ (EUA) e do Instituto ‘Max Plank’ na Alemanha. Os dados recolhidos foram tantos, que tiveram de ser enviados para estes laboratórios de análise por correio postal, sendo impossível o seu envio através da internet.

Os dados de rádio podem ser processados em formato de imagem ou tocados como se de uma partitura musical se tratassem; esta análise é feita através de um método designado por ‘interferometria’, usado regularmente nas Ciências da Terra e do Espaço, como a Astronomia, a Oceanografia, a Sismologia ou a Mecânica Quântica.

Mais do que uma descoberta científica de alto-nível ficou demonstrado que os grandes avanços no conhecimento contemporâneo só podem ser atingidos com equipas alargadas de investigadores profissionais e competentes, com acesso a recursos adequados. Outros exemplos relevantes dos avanços científicos em cooperação são: o CERN, o maior acelerador de partículas do mundo, que emprega cerca de 2,500 cientistas, e que confirmou a existência do ‘boson’, uma partícula inicialmente descrita pelo físico teórico e detentor do prémio Nobel Peter Higgs; e a ‘ESA – European Spatial Agency’, que congrega a participação de 22 estados membros, empregando atualmente cerca de 2,200 técnicos de ciência.

Nós por cá, vivemos outra dimensão da Ciência. Se a memória não me falha, já fomos elegíveis para ostentar um telescópio na Madeira. O rádio-observatório mais próximo está instalado na Serra Nevada, em Espanha, que também tomou parte na recolha de dados para a caracterização do M87. Somos poucos cientistas a trabalhar na Região, para criar massa crítica necessária para efetivar ‘grandes descobertas’. No entanto, parece-me relevante prestar atenção a estes grandes marcos da ciência internacional. É importante não nos fecharmos em capelinhas com pouca (ou nenhuma) visibilidade internacional, e com pouca percepção da dimensão Mundus. É importante compararmos os nossos currículos com os dos melhores; é importante criar redes regionais com elegibilidade internacional, é fundamental trabalhar em prol de uma Região, substituindo o individual pelo coletivo. Particularmente, numa Região Ultraperiférica de pequenas dimensões, um todo organizado é mais, muito mais, do que a soma das partes.