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Das alvíssaras para 2020

A desigualdade, a pobreza, a fome, o racismo, o chauvinismo, o iliberalismo e a injustiça, pelas tendências atuais, continuarão a sua rude saga em 2020

O Ano Novo é uma espécie de clarim das alvíssaras, com as suas grandezas e miudezas. Entre as grandezas, algumas em preparação:

1. Comemorarmos o 1.º Aniversário da Língua Portuguesa como Língua do Mundo, no próximo mês de maio, em Hanói e, se possível, lermos “As Estrangeiras”, de José Luís Peixoto (uma peça de teatro que engendra o encontro entre uma brasileira, uma cabo-verdiana e uma portuguesa na sala da polícia de fronteira num aeroporto norte-americano) e “Morreste-me”, do mesmo autor, relido por este e por mim (em Língua Cabo-verdiana, sob o título “Bu More-m”;

2. Realizarmos a 4.ª Edição do Festival de Literatura-Mundo do Sal, de 17 a 21 de junho, desta feita a homenagear o Poeta Cabo-verdiano João Vário e o Escritor Maliano Hamptê Ba. Mais um certame promovido pela Câmara Municipal do Sal, organizado pela Rosa de Porcelana Editora e com a curadoria científica da Professora Inocência Matta;

3. Celebrarmos em Roma e no Vaticano o 50.º Aniversário da Conferência Internacional de Solidariedade para com os Povos das Colónias Portuguesas e da Audiência do Papa Paulo VI a Amílcar Cabral, António Agostinho Neto e Marcelino dos Santos, entre 1 a 3 de julho, numa parceria com o evento Cabral Agrónomo, igualmente a ser realizado na mesma ocasião. Em Roma, naturalmente;

4. Assinalarmos com uma grande reflexão poético-literária o 5.º Ano da morte do Poeta Corsino Fortes, na cidade de Lisboa. Corsino Fortes, sedutor na forma como desencarnava palavras, era um espírito de luz. Elegante como nenhum outro, laborava qual dançarino de salão na cabeça calva de Deus e soube partir de nós sem alarde, apenas e tão-só pelos sinos no silêncio. Poeta de coração aberto, onde todos podiam entrar pelo tapete vermelho;

5. Comemorarmos o 45.º Aniversário das independências nacionais de Angola, Cabo Verde, Moçambique e São Tomé e Príncipe, através de edições de alguns autores destes nossos países africanos de Língua Oficial Portuguesa. Com a independência, estes têm uma longa estrada para consolidar a democracia e colocar na calha o desenvolvimento sustentável.

Das coisas amofinadas, em verdade piores do que as miudezas, sabemos que a crise climática, o morticínio da travessia do mar Mediterrâneo, o terror fascista no Brasil atacando o programa “Portas dos Fundos”, as guerras intermitentes e o fumo perigoso da nova guerra fria têm exigido prosa gorda e crítica. E esta tenebrosa sensação de que não sabemos da missa a metade.

A desigualdade, a pobreza, a fome, o racismo, o chauvinismo, o iliberalismo e a injustiça, pelas tendências atuais, continuarão a sua rude saga em 2020. Todavia, nada pode estar perdido, enquanto estivermos dispostos em dizer não. Não apenas no plano abstrato e imaterial, mas o não coerente e consequente de retirar as pedras no caminho.

E que a felicidade bata nas aldravas das nossas portas em 2020!