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A Agenda Oculta do Submarino

O submarino Tridente veio à Madeira com duas missões. Uma oficial e menos importante, de instrução dos alunos do Centro de Instrução de Submarinos, e uma outra oculta e não oficial mas de grande importância, que foi a de comemorar a semana em que se assinalou o dia mundial contra a corrupção. Este submarino assinala o dia mundial contra a corrupção pois lembra-nos da singularidade do conhecido caso dos submarinos, em que os corruptores foram todos condenados na Alemanha, e em Portugal parece que ninguém foi corrompido.

Esta visita leva-me a falar de corrupção, que é um tema que eu não gosto e evito, porque é sempre tratado com alguma leviandade e é normalmente mal abordado. Mas é de facto importante falarmos sobre estes assuntos, sobre o que é conhecido por cada um de nós numa matéria que é de grande sensibilidade e atualidade. E é esta a agenda não oficial que o submarino Tridente trouxe à Madeira dois dias depois de assinalado o dia internacional contra a corrupção, através daquele que é um dos maiores ícones da corrupção em Portugal. Outra coincidência interessante que envolve este submarino e o seu “irmão” Arpão, é que a ONU decidiu instituir este dia internacional contra a corrupção no mesmo ano em que o XV Governo Constitucional de Portugal lançou o concurso público para aquisição destes dois submarinos. É óbvio que a ligação não é direta, mas não deixa de ter alguma ironia.

A corrupção, é de facto um fenómeno social, político e económico muito complexo. É transversal a todos os países do mundo e não unicamente aos países mais pobres e subdesenvolvidos, como muitas vezes somos levados a acreditar. É um problema que afeta o clima de confiança nas instituições e que mina os valores que servem de alicerces à coesão social. É um problema que tem graves consequências económicas e sociais, pois enfraquece a estabilidade, a coesão e destrói a ética, a integridade e a justiça. A corrupção é fatal para equidade social, para as empresas e em última análise, fatal para a democracia.

É inequívoco que Portugal tem adotado praticamente todas as normativas internacionais nestas matérias. Fazendo jus ao seu estatuto de “bom aluno”, tem vindo a criar normativas jurídicas e regulamentos institucionais que respondem a todas as recomendações internacionais. Temos leis, regulamentos e organismos para quase tudo, pelo que se poderá dizer que não nos falta nada para um combate eficaz à corrupção. Como não nos falta nada, partimos do principio de que o problema está resolvido. Mas a verdade é que não está. Estudos elaborados anualmente, revelam consistentemente que os Portugueses continuam a ver corrupção em todos os níveis da governação pública, desde o governo, às autarquias, chegando também aos serviços da administração pública.

Esta precessão que os Portugueses têm da corrupção no nosso país, é plenamente justificada pela completa imunidade que tem caracterizado os mais diversos casos de corrupção que têm assolado o país. São inúmeros os casos com fundos estruturais, derrapagens em obras públicas, contratação pública, ajustes diretos, finalizando todos eles com a prescrição massiva destes casos na justiça. As discrepâncias são muitas, e as medidas repressivas que existem através dos tribunais e polícias revelam-se completamente ineficazes. Os casos mais mediáticos, como os dos submarinos, do GES/BES e da detenção do antigo primeiro ministro fazem prova disso. Nos submarinos foram condenados os corruptores (fora de Portugal) e em Portugal ninguém sequer foi julgado. No GES/BES ficou provado que os nossos tribunais têm grande dificuldade em julgar crimes feitos a partir de dentro dos bancos. O caso da detenção do antigo primeiro ministro é também muito peculiar, pois acusou-se o corrompido, mas não foi acusado nenhum corruptor.

Que me desculpe o Ferro Rodrigues, mas isto é uma VERGONHA. Vivemos num país com as leis e os meios capazes de afrontar a corrupção, mas que nada faz, unicamente pela falta de vontade política em fazer implementar efetivamente todas essas medidas. Esta inércia política, traduz-se num conjunto de problemas que fazem com que os processos se arrastem ao longo do tempo até ao seu arquivamento. Para bem de todos nós e da nossa democracia, a culpa tem de deixar de morrer solteira!