Análise

Impunidade sem limites

O Governo Regional perdeu todo e qualquer pudor face às nomeações de clientela partidária para os lugares da administração pública. A ‘máscara’ caiu mal foram conhecidos os resultados eleitorais. Daí para cá temos assistidos a um assalto sem paralelo à máquina do poder na Região. Sem filtros e à vista de todos.

O governo faz tábua-rasa das elementares regras da ética e dos princípios democráticos para colocar os amigos nos gabinetes, nas empresas, nos institutos, protagonizando um festim onde não faltam ligações familiares próximas. 43 anos depois, o laranja e o azul fundiram-se com as cores da autonomia.

Nos conselhos de administração das empresas públicas a gula partidária intensificou-se e, sem justificação convincente, o executivo procede ao aumento do número de vogais apenas e só para saciar dirigentes do PSD e do CDS. Na ‘Habitação’, primeiro. Depois virá o SESARAM. Os critérios de competência sucumbiram aos da influência e chantagem partidária. Na Saúde o escândalo assume contornos indecentes. Para colocar uma ex-secretária regional no comando do IASAÚDE, o governo vai mudar os estatutos do organismo porque a senhora não possui as qualificações necessárias para o desempenho do cargo. Como se não bastasse criou mais uma direcção regional, com tudo o que isso implica a mais de despesa pública, para suprir a dificuldade que a indicação forçada de Rita Andrade implica. Na direcção clínica do SESARAM assiste-se a outra trapalhada semelhante. Filomena Gonçalves não assumiu o lugar porque foram detectadas, a tempo, ilegalidades contratuais, que têm de ser ultrapassadas. Qual o problema? Nenhum. Até lá arranja-se um substituto provisório, porque o serviço de saúde só pode ser liderado por esta médica, competentíssima ao que sabemos, que é dirigente do CDS e pessoa próxima do deputado Mário Pereira, que tem feito valer toda a sua influência política na empresa. Entretanto, um concurso público à medida da cirurgiã já está em marcha. Sobre as listas de espera e sobre a falta de condições hospitalares? Nem uma palavra.

No melhor destino insular da Europa e do Mundo andamos nisto há longas semanas, perante a indiferença generalizada dos partidos da oposição e com parte da sociedade focada na lastimável ‘barracada’ da Placa Central, como se todos os nossos problemas desembocassem ali. Nesta espécie de circo político que antecipa o Natal ficamos a saber que na Madeira regista-se a segunda taxa mais elevada de risco de pobreza do país. Ficámos também a saber que as nossas crianças passam horas a mais nas creches e que a acção social escolar abrange muito mais alunos na Região do que no continente. Mas importam todos estes sinais? Rigorosamente nada. Em Lisboa, o primeiro-ministro foi ao Parlamento anunciar medidas para combater a pobreza, reconhecendo-a e elegendo-a como uma das principais preocupações. E por cá? Um dia depois, o Conselho de Governo decide expropriar temporariamente parte da avenida Arriaga e as latrinas da praça da Restauração, para que não falte poncha e arraial nas semanas da Festa. Delicioso. No meio desta ‘guerra de alecrim e manjerona’ faltava a ‘cereja no topo do bolo’: é-nos anunciado que vai ser criado um grupo de trabalho para resolver a questão do subsídio social de mobilidade. Em português corrente é a mesma coisa que dizer que nada vai ser solucionado em breve e que o madeirense vai continuar a pagar uma pequena fortuna para se deslocar a Lisboa. Foi nisto que deu o “diálogo permanente” que Miguel Albuquerque inaugurou no novo relacionamento com o governo da República.

Sobra-nos o consolo de que a Madeira cresce consecutivamente há 76 meses, mesmo que isso não diga rigorosamente nada à esmagadora maioria da sua população.