Análise

Europa distante, fome e liberdade

Ainda nem se realizou o primeiro acto eleitoral do ano e os ânimos aquecem a cada dia que passa. Aquecem no seio da comunidade política, sequiosa de palco e alheada do que deveria nortear esta campanha. Os eleitores, esses estão cada vez mais ausentes da discussão sobre o futuro da Europa, sobre a importância da UE para as regiões ultraperiféricas ou sobre o destino sombrio e incerto reservado ao Centro Internacional de Negócios da Madeira. Para os partidos e para a maioria dos candidatos interessa promoção, aparecer, tentar marcar a agenda, mesmo que sem brilho nem chama. O verdadeiro combate está guardado para 22 de Setembro. Percebe-se. As Europeias de hoje a três semanas serão uma etapa numa espécie de ensaio para as máquinas partidárias. Não são ‘Regionais’. São eleições onde há candidatos indicados pelas estruturas partidárias locais. Os seus resultados podem não reflectir a vontade do eleitorado face ao embate marcado para daqui a cinco meses. Está-se, contudo, a laborar no erro de as tornar numas ‘primárias’. O tiro pode sair pela culatra.

‘Muita parra e pouca uva’ é, em resumo, ao que temos assistido, tirando honrosas excepções, em centrar o debate europeu como determinante no futuro da Região. Tanto o PSD como o PS-M já têm as suas candidatas eleitas. Cláudia Monteiro de Aguiar e Sara Cerdas seguram já o ‘passaporte’ na mão, para um mandato de cinco anos. Depois de 26 de Maio veremos se mantêm o ritmo de mostrarem trabalho à população que as elegeu. No que a candidatos da Região diz respeito o resto é paisagem, apesar de o CDS acalentar a esperança de ver Margarida Pocinho em Bruxelas por via de uma pouco provável rotatividade de deputados. A maioria dos nomes indicados pela Região é́ ‘erro de casting’, cumpre calendário, e não consegue mobilizar ninguém em torno de um debate que interessa muitíssimo à Madeira. Muito menos galvanizar a população a votar, numas eleições onde historicamente a abstenção é destacada vencedora. Os partidos foram prudentes e não quiseram ‘queimar’ nenhum nome forte, porque estão a olhar para as eleições regionais. O tacticismo político vence, uma vez mais, ao interesse particular do escrutínio. Perde-se uma oportunidade.

Numa terra onde existem pelo menos 2.700 madeirenses que dependem de ajuda pública para comerem; numa terra onde ainda persiste uma cultura persecutória sobre os que ousam opinar de forma diferente; numa terra onde a taxa de desemprego é a mais alta do país e a extinção de uma espécie, a cabra do Bugio, radicada há cinco séculos nas Ilhas Desertas, constituindo provavelmente a última colónia selvagem do Mundo, nada ou quase nada surte qualquer efeito prático. A culpa é e será sempre da República, dos inimigos da Autonomia e do desenvolvimento regional. Onde já ouvimos isto? Sempre que se coloca a nu uma falha da governação local, recorre-se ao pretexto de sempre, sem argumentação que esclareça. Assumpção de responsabilidades? Isso é difícil, numa terra onde ninguém se demite ou é demitido, mesmo que usurpe as suas funções, que beneficie amigos e participe em negócios questionáveis. É mais fácil atirar as culpas para a frente, assobiar para o lado.

Comemorou-se sexta-feira o Dia da Liberdade de Imprensa. Que tem de ser defendida por todos, todos os dias. Este é um direito inalienável. Contra a manipulação das redes sociais, contra as tentações do poder político e económico, a sua independência tem de ser vincada e respeitada. A nossa missão é informar, esclarecer, doa a quem doer, de forma justa e plural. Incomode quem incomodar. A liberdade de informar é um dos pilares da democracia, por mais azia que isso ainda possa causar a quem não goste de ser escrutinado.