Análise

Deu-lhes uma branca?

Estava escrito nas estrelas que um dia a alucinação tomaria conta da vida pública regional, por coincidência, com mais ênfase, na semana em que o País viu serem apreendidos 745 quilos de cocaína escondidos em ananases vindos da América Latina. Não há aqui qualquer insinuação doméstica. Até porque na Região os ananases chegam dos Açores e a cimeira insular só começa terça-feira. É que a Madeira é pântano propício a golpadas. Chamam-lhe “chapeladas”, que por serem tantas e tão frequentes davam um suplemento. Vamos às mais recentes.

. Miguel Albuquerque entende que é o candidato a apresentar pelo PSD nas Regionais 2019, por ter sido essa a decisão do Congresso. Deu-lhe uma branca? Se os estatutos forem respeitados, os social-democratas têm reunião magna em Janeiro desse ano, logo, antes das eleições, e pelo que já ouvimos há Rui Marques, Pedro Coelho, Rubina Leal e Pedro Calado à espreita. Isto para não falar de Cunha Silva, um dos vencedores regionais nas directas nacionais de sábado passado, de Manuel António Correia que continua com tropas no activo, do sempre disponível Miguel de Sousa e de Jaime Filipe Ramos, que é coordenador dos deputados madeirenses na Assembleia da República que não se entendem uns com outros!

. Apesar de divididos, os social-democratas da Madeira deram vitória a Rui Rio e de repente quase todos os que não deram publicamente a cara por Santana Lopes ganharam. Deu-lhes uma branca? O PSD-M fingiu equidistância neste processo eleitoral, mas a máquina regional mobilizou-se para pagar quotas de modo a que Santana Lopes vencesse. Foi quem mais percebe do expediente que o denunciou. Como ninguém o desmentiu, estamos esclarecidos.

. Houve na tutela do IHM quem tentasse esvaziar notícias fazendo publicar na imprensa oficial a versão conveniente antes de quem solicita os dados e as reacções. Deu-lhes uma branca? Já uma vez escrevemos que o exercício prévio do contraditório, a que estamos obrigados, é um perigo quando não há ética numa das partes que importa ouvir. Já sabíamos que os e-mails que enviamos a fazer perguntas geralmente são reeencaminhados para terceiros, alimentam estratégias de intoxicação e são usados no argumentário político. É lamentável que quem presumíamos defender uma sociedade democrática se apresse a dar razão aos que se queixam dos atentados ao direito de informar.

. A carência de meios humanos e materiais está a levar clínicos dos hospitais a pedirem exclusão de responsabilidades. Os profissionais sindicalizados estão mesmo a utilizar minutas específicas para se demarcarem das consequências dos tratamentos sem qualidade. Os médicos endurecem a sua posição junto do Serviço de Saúde da Região e o que faz maioria e a tutela? Esconde actas, vai em romaria para eventos públicos quando antes bastava ter um representante, fala em duplicado, deturpa estatísticas, fomenta gestões bicéfalas e cai em contradição.

. A propósito das eleições no PS-M, manchadas pelos desnecessários ajustes de contas fraticidas e pela indisponibilidade para o confronto de ideias, muitos dissertaram sobre a competência que é elementar na liderança dos partidos. Esqueceram-se por instantes que na política, como no futebol, há muitas formas de ganhar um jogo. Os estrategas fazem-no recorrendo aos trunfos com provas dadas. Os inteligentes primam pela antecipação. Os espertos, também conhecido por caciques, recorrem à chantagem, à calculadora ou à batota. Os remediados replicam muito daquilo que o adversário engendra, e a este nível o PS-M acaba por seguir à risca o que o PSD-M já colocou em prática: Miguel Albuquerque é o líder mas quem governa é Pedro Calado. Mas há também quem compre o árbitro!

Neste ambiente há quem se preste a ser cúmplice da posição dominante. Não nos parece que seja serviço que se recomende. “Chapelada” é também perpetuar a mentira compulsiva; fazer recuar dossiers em que a Madeira era líder nacional, como o novo modelo de transportes públicos, por causa de não haver fuga de votos a Oeste nas próximas eleições; acenar com ferry o ano inteiro mas disponibilizá-lo apenas durante três meses; sustentar a vertigem para ouvir cidadãos e promover ao poder os melhores da sociedade civil, ideias que ficam literalmente na gaveta e gente toda ela dispensável quando chega a hora de distribuir tachos e recompensas.