O Santo e a Feira

Em Janeiro de 2013, dia 3, a reunião de Câmara de Santa Cruz foi palco de um protesto de cerca de 5 dezenas de feirantes do Santo da Serra, representados por um advogado, contra um despacho da vereação PSD para encerrar a feira no fim de semana seguinte por falta de pagamentos apesar dos vários apelos intentados.

A então maioria da oposição, eu incluso, fez reverter o referido despacho na condição de se formalizar um registo de feirantes e de se iniciar, dentro de uma semana, um plano de pagamentos.

Até ao final do mandato, em Setembro de 2013, a causa da feira do Santo não voltou às reuniões nem testemunhei qualquer outra menção, pelo que julgo que o problema, se não foi devidamente sanado, pelo menos foi considerado sanável.

Mas, bruscamente, ao fim de mais de 6 anos, alegando uma falta generalizada de pagamento, os feirantes foram informados por edital e imprensa de que a feira encerraria definitivamente dentro de 3 semanas, tendo já sido denunciado o arrendamento à Diocese.

Será que, num estado de direito, não há meios legais e físicos de fazer cumprir um contrato senão destruindo o lugar desse contrato, seja cumpridor, seja incumpridor? Pelos vistos a nova gestão camarária nada de novo trouxe às críticas então apontadas em Janeiro de 2013. Mas, politicamente, houve algo de novo. Em 2013 um vereador da oposição era Filipe Sousa e agora com igual nome há um presidente.

E que pensar do facto de, decidido denunciar o contrato de arrendamento à Diocese em reunião de câmara de 16 de Maio de 2019, os feirantes apenas terem sido avisados 5 meses depois? Só cabe lembrar o calendário eleitoral e constatar o desrespeito completo, pelo menos, para quem ficou com um stock prevendo o Natal.

Aliás, na acta da reunião, o sr. vice-presidente esclarece “que as pessoas (...) desde há muito tempo não cumprem as suas obrigações enquanto utilizadores do espaço”, mas não refere a existência de um qualquer diálogo, proposta ou mesmo ultimato prévio, o que evidencia um assumido desprezo social discriminatório. Pois, se a boa política se faz com inclusão social, também a política calculista se faz com a exclusão social. Não é verdade, André Ventura?

Mas interessa considerar o binómio, o Santo e a feira, pois esta já é uma realidade digna do ditado: ”Cada terra com seu uso cada roca com seu fuso”. Com a consolidação deste uso, a sinergia da feira e do mercado agrícola faz atrair os forasteiros reavivando a cada domingo a vida social e económica do Santo da Serra.

Quanto perderão os agricultores da terra com a desertificação da feira e consequente desinteresse para os visitantes do exterior? Além do mais perde-se o estacionamento, uma grande área com custo igual a metade do módico arrendamento.

Assim se vê que o edital, tardio para os feirantes, foi sobretudo tardio para os eleitores do Santo da Serra. É, alias, intrigante que esse edital, cujo número 189/2019 é cronologicamente anterior aos editais do início de Julho, só fosse publicado com data de 10 de Outubro.

Uma questão final: quantos anos de renda vai custar repor o terreno nas condições iniciais?