A centralidade da Autonomia
Quando uma comunidade humana, radicada num território, tem condições, identidade, personalidade e características próprias, ela deve ser tratada da mesma forma como é tratada uma pessoa individual, isto é, com integral respeito pelas suas idiossincrasias, pela sua liberdade, pela sua História e pelas legítimas aspirações do seu povo. Quando assim é, esse respeito deve traduzir-se no reconhecimento da necessidade de aprofundar Autonomia Política, condição fundamental para que essa comunidade possa continuar a trilhar o seu percurso sociológico de forma eficaz, coerente e equilibrada.
Em síntese, é esse o pensamento que deve orientar, sem hesitações, nem tibiezas, a acção de qualquer governo ou governante que se tenha como personalista, isto é, que entenda a pessoa como o fim de toda a actividade humana e que compreenda a política como uma plataforma que deve estar ao serviço da sua inteira realização, não só na dimensão social e económica, mas também no âmbito da Saúde, da Educação, da Justiça e de todas as demais componentes que formam a multifacetada experiência humana.
Infelizmente, desde o advir da Democracia constitucional, iniciada em Abril de 1974, mas apenas consolidada em Novembro de 1975, esse não tem sido o entendimento de certos líderes e de umas tantas forças partidárias que têm, ciclicamente, comandado os desígnios do país. Porventura mais saudosistas de que a História volte atrás do que confiantes na diferenciação política que é natural no processo de evolução e de progresso de uma nação repartida entre uma dimensão continental e uma expressão atlântica, tais entidades recordam-nos do peso e valor que o reforço da Autonomia tem sempre de ocupar no discurso e na prática de todo e qualquer agente político aspire representar e dar voz ao Povo Madeirense.
Por outras palavras, não há causa, desígnio, prioridade ou interesse que deva ou possa, alguma vez que seja, suplantar a missão de defender e aprofundar as condições da nossa Autonomia, a qual, por sua vez, tem de ser entendida como canal privilegiado para edificar uma sociedade digna e livre daqueles que, por convicção retrógrada ou conveniência tacticista, têm optado por defender, a todo o custo, o centralismo anacrónico e a mediocridade político-constitucional à sombra do qual uma certa minoria se apascenta, explorando, com os seus jogos de poder, todos aqueles que, com a sua dedicação e trabalho honesto, dão vida, força e estrutura a esta nação milenar, tão ciente do seu percurso continental quanto orgulhosa da extensão oceânica que lhe é conferida pelas autonomias.
Porque ainda há quem perceba que a Autonomia é missão de vida – e não mero e inócuo tema de campanha eleitoral, ressuscitado oportunamente quando é hora de ir pelas estradas fora distribuir canetas e conquistar votos – é relevante que se diga que nunca seremos verdadeiramente senhores da nossa vida enquanto não garantirmos, em permanência, ligações marítimas dignas e regulares, ligações aéreas acessíveis e competitivas, um sistema fiscal próprio e potenciador de investimento externo que seja gerador de emprego e riqueza, órgãos de governo que sejam autoridade sobre todas as matérias que não sejam exclusivas do Estado e uma liberdade efectiva e real de todas as réstias institucionais dos tempos coloniais.
Enquanto isso não acontecer – não em meras declarações circunstanciais, que rapidamente caem no esquecimento, mas em atitudes políticas de apoio incondicional à justiça das convicções do Povo Madeirense – seremos sempre uma Autonomia limitada. E, por isso mesmo, um Portugal menor.