Crónicas

Rodrigues pode ser presidente?

Depois da entrevista, preciso saber, antes das eleições, se vai ou não ser o presidente da Assembleia. Imagino que se não publicitam é por temor do efeito sobre o eleitorado. Porque uma mais valia eleitoral nunca se esconde

Miguel Albuquerque não deve ser grande espingarda como presidente do governo regional. Pelo menos na opinião de José Manuel Rodrigues, presidente da Assembleia Legislativa da Madeira. Uma hora de entrevista na televisão e nem uma palavra de elogio ao presidente do governo regional e líder do PSD, como tal chefe da Coligação que salva o CDS da imediata extinção.

É a sua conduta. Sempre repetida. Nada de elogios ao presidente do governo.

Deu para dar a saber que é seu familiar, o que não ajuda para currículo. As proximidades familiares foram sempre, na política madeirense, uma alavanca para ultrapassagens abusivas. Qual é o primo e qual é o presidente ?

“Eu sou o referencial de estabilidade política”. Nem mais! Foi assim mesmo. Vindo da chantagem negocial para que o PSD não deixasse de continuar na governação regional atreve-se a se fazer pivot da vida política madeirense. Não é Miguel Albuquerque, político mais popular em todas as sondagens, nem Rui Barreto, chefe do seu pequeno partido ou o próprio PSD. Não senhor, não é nenhum deles. É José Manuel Rodrigues, o tal que abriu as portas e a frasqueira do parlamento a todo e qualquer um que queira aparecer na televisão ou no jornal. Com uma condição: tirar foto com o presidente ou ouvi-lo num discurso de ocasião.

Há melhor debate político? Não! Também a oposição não ajuda. Os deputados ampliaram a ação individual ou colectiva? Também não parece. A melhor qualidade da vida política e partidária adveio, no entender de Rodrigues, da ida ao parlamento de grupos culturais, de música ou outros “convidados”. E dos prémios atribuídos.

O ainda presidente da Assembleia teve a descortesia de querer “marcar” o seu entrevistador, o competente jornalista Paulo Santos, denunciando ter sido ele um dos premiados. Claramente para o condicionar. Vá se saber como chegou à entrevista?

Sejamos claros. Eu exijo saber, antes das eleições, se José Manuel Rodrigues é, ou não é, o próximo presidente da Assembleia Legislativa. Pensem o que quiserem.

Se escondem a possibilidade de vir a sê-lo é por temor do efeito negativo que possa ter sobre o eleitorado. Uma mais valia eleitoral não se esconde.

Tanta arrogância de quem, politicamente, nada vale, nunca tinha sido vista. Total descaramento.

É mentiroso. Politicamente mentiroso. Sabe perfeitamente, e o jornalista o referiu, que afirmou, em 2019 na televisão, que ou era presidente da Assembleia ou o PSD ia para a oposição. Essa chantagem pós-eleitoral foi-me confirmada e é bom que eu não tenha de ir ao fundo da questão.

Em segundo lugar, repete que o lugar que ocupa lhe foi atribuído pelo povo. Falso. Completamente falso. Deve o lugar a quem o pôs na lista do CDS e a quem cedeu na sua exigência rocambolesca. Deixe-se de tretas: só um processo ínvio o colocou no lugar onde está. Uma via democrática, séria, com lisura ética e moral nunca tinha possibilitado o resultado que a todos nos espanta: ser presidente da Assembleia.

Cargo que é legitimamente do PSD. Estranho andar quase tudo calado.

O PSD foi politicamente chantageado enquanto que o CDS resignou-se infantilmente. O que teria sido um acordo aceitável por todos tornou-se insustentável pelas exigências pessoais do vigésimo quarto deputado.

José Manuel dá o exemplo de, em 2015, a nível nacional, as forças políticas mais votadas não terem formado governo por força da “geringonça”. Igualzinho ao seu caso. Ao partido mais votado (PSD com 21 deputados) foi-lhe tirada a presidência da Assembleia pelo CDS com apenas 3 deputados. Tão errado uma como a outra.

Depois seguiu-se um rol de auto-elogios, próprios de quem não tem vergonha e que são graves. Julga-se o mais importante!

O Senhor Rodrigues sabe, porque foi seu feroz adversário, que quem promoveu um sistema presidencialista de governo foi o PSD, actual parceiro de coligação do CDS. O dr. Alberto João Jardim, a quem hoje José Manuel Rodrigues afaga as costas com palmadinhas de circunstância, foi o artífice desse posicionamento entre governo e parlamento. Ninguém pediu a JMR que alterasse esse estado de coisas, ainda que se gabe do parlamento ter passado a ser o epicentro do debate político, nas suas próprias palavras. “Não há subalternização do parlamento face ao governo” gabou-se na RTP-M.

No epicentro à volta de quem? De Sua Excelência o Presidente da Assembleia, qual cruzado contra a herança de Jardim e do PSD. No fundo, o que Rodrigues veio dizer é que Miguel Albuquerque perdeu a liderança da vida política regional, a qual se transferiu para ele próprio. “Eu posicionei-me como o referencial de estabilidade política”. “Comigo começou um tempo novo”. “Eu abri a Casa do Povo”. “Consegui o desígnio de aproximar os madeirenses e os portosantenses do seu parlamento e levar que os próprios deputados se aproximem mais daqueles que os elegem”.

O homem é perigoso e abusador. Partiu para caminhos que tinha como seus, sendo que teve a condescendência do grupo parlamentar do PSD. Cumplicidade que agora levanta questões se havia toda a intenção.

Quer o Sr. José Manuel Rodrigues queira ou não, o dr. Miguel Albuquerque é o líder regional, a referência política da Madeira e a Coligação está toda dentro da sua condução política. Ou é assim ou não há Coligação, simplesmente porque de outra forma não pode ser. Tudo tem de ter um chefe. Uma orientação clara e definida. Regras e disciplina. E a liderança não está em qualquer José Manuel Rodrigues. Nem sequer a do próprio CDS. Que eu saiba continua Rui Barreto na chefia.

José Manuel Rodrigues perdeu oportunidade para estar calado. Ao pretender afirmar o seu estatuto político mais não fez que se enterrar. Colocar as coisas difíceis para o PSD e para a Coligação. Sobretudo para aquele a quem deve lealdade e decência na atitude pois é seu líder de caminhada política, ainda que a contragosto de muitos como eu. E JMR, sabendo disso, nada fez para apaziguar, pelo contrário, atiçou uma opinião que eu próprio já tinha posto de lado nas minhas preocupações.

A cereja do bolo na entrevista: “a hierarquia do governo também obedece ao resultado eleitoral”. Pergunto: e a hierarquia na Assembleia? Obedece a quê? A capricho pessoal oportunista depois de 26 anos como deputado?

Segunda cereja na RTP-M: “esta é a visão de quem está de fora”. Fora de quê?

Numa entrevista com evidente falta de sinceridade, tantas eram as cábulas de suporte do ainda presidente, deixo aqui mais uns registos patéticos para quem não conhece o personagem:

-“o CDS abdicou dos seus interesses partidários a favor da Coligação”;

-“houve sempre uma aproximação ideológica”;

-“o lugar de Rui Barreto é simbólico”;

-“soube interpretar o sentimento do povo em eleições”;

-“vou fazer canal televisivo da Assembleia mas não pensei na programação”;

-“precisamos de um elevador social mais acelerado e salários mais altos”;

-“o CDS teve de criar duas secretarias regionais que não existiam”;

-“as nossas ideias para o programa do governo”.

O homenzinho não está bem e precisa suspender a medicação.