Madeira

Erosão abala casas no Lugar de Baixo

Os moradores apontam o dedo à Marina do Lugar de Baixo. Uma obra que nada trouxe de bom à zona. Várias casas apresentam fissuras decorrentes da trepidação.

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A forte agitação marítima que se fez sentir na passada segunda-feira fez estragos em algumas zonas do litoral da Madeira. Tal como relatou o DIÁRIO, na edição de terça-feira, houve danos no cais da Ribeira Brava, que obrigaram à remoção das embarcações, na Praia Formosa, onde o passadiço voltou, uma vez mais, a ficar danificado com a violência das ondas, e no Porto Moniz.

“Mas do Lugar de Baixo ninguém fala. Quando há muita agitação marítima vêm para aqui muitos curiosos tirar fotos e fazer vídeos, todos gostam de ver a força das ondas, mas ninguém se preocupa com os problemas que aquela obra tem causado à população”, lamenta Isabel Silva, de 80 anos, moradora no sítio do Lugar de Baixo há mais de seis décadas.

“Na segunda-feira foi bem pior do que das outras vezes. A casa estremeceu tanto que achei que era um abalo de terra”, confessa, dizendo logo que o “mar bravio não é novidade” para as populações que vivem nas zonas costeiras, mais não seja por estarem habituadas aos estrondos que fazem as rochas, mas o que é, “nem diria novo, porque já é frequente, e ninguém me diga que não é por causa da obra da Marina do Lugar de Baixo, é a casa a estremecer”.

“Até os animais já sentem e ficam agitados nestes dias”. Isabel Silva explica que aponta o dedo à obra na Marina do Lugar de Baixo e que o faz com conhecimento de causa. Era vereadora na Câmara Municipal da Ponta do Sol quando se discutiu o projecto para aquela zona e “a verdade é que ninguém quis dar valor à opinião das pessoas que viviam no Lugar de Baixo. Os próprios pescadores diziam que não ia dar bom resultado, mas como não eram letrados… O projecto inicial não era para ser feito ali”.

Também Alberto Reis acusa os governantes de esquecer o sítio do Lugar de Baixo. O ‘mamarracho’ lá deixado, ao abandono, tem, no seu entender, provocado os estremecimentos, cada vez mais frequentes, das habitações. “As fissuras causadas pela trepidação são apenas um dos problemas. A desertificação desta costa é um problema que não pode continuar. Todos vêem e todos fecham os olhos”.

O morador diz que é curioso que, de repente, se tenha deixado de falar desta obra. “Até a própria oposição está calada. A obra não avançou mais, mas os problemas deixados precisam de uma resolução. É até um perigo usar esta praia no Verão por causa de tanto ferro que se vê espalhado”.

Ao DIÁRIO, estes moradores confirmam que estão a preparar um documento, “mais oficial”, para enviar à autarquia da Ponta do Sol e ao Governo Regional, “a quem possa ainda ter a responsabilidade pela obra”, onde pretendem dar conta desta preocupação e pedir uma avaliação às habitações.

Maria Santos entende mesmo que “enquanto ali estiver a estrutura isto não vai parar”. “Nem imagina como as casas estão danificadas. A maresia estraga tudo… os ferros, os carros, as plantas”. A moradora contesta quem diz que este são os problemas ‘normais’ de quem vive junto à costa. “Há anos e anos que aqui vivo e isto só piorou com a construção da Marina do Lugar de Baixo. Afinal os engenheiros com a quarta classe ainda sabiam umas coisas”.

Sidónio Pestana, da Câmara Municipal da Ponta do Sol, refere ao DIÁRIO que a autarquia teve conhecimento destas reclamações e que vai enviar um pedido à Secretaria Regional do Equipamento e Infra-estruturas para que seja feita uma avaliação às habitações. A trepidação, conforme adianta, deverá ser avaliada quando as condições atmosféricas sejam as adequadas, mas “os danos nas habitações podem ser vistos pelo Laboratório Regional de Engenharia Civil (LREC) em qualquer momento”.

O autarca, ele próprio a residir no sítio do Lugar de Baixo, confirma em primeira mão o ligeiro abalo sentido pelas 8h05 da manhã de segunda-feira. Também o avanço do mar naquela zona da Ponta do Sol, que já ‘levou’ inclusive algumas habitações, é outra situação que precisa de uma resposta por parte das autoridades competentes.

“Percepção sensorial é importante”, mas não invalida estudos, diz o geólogo João Baptista

Sobre a preocupação destes moradores do sítio do Lugar de Baixo, freguesia da Ponta do Sol, o geólogo João Baptista diz ser muito importante a percepção sensorial da população, ao nível da trepidação das casas, da agitação dos animais domésticos e até mesmo dos danos nas estradas. “A energia provocada pela rebentação de uma onda é completamente diferente da energia sísmica. Para tirarmos ‘sumo’ dessa percepção, desta quantificação sensorial, precisamos de mais estudos”.

O LREC - Laboratório Regional de Engenharia Civil ou mesmo o Instituto Português do Mar e da Atmosfera podem e devem ser solicitados para, através dos equipamentos de que dispõem, aferir a real situação. O especialista considera natural o medo sentido pela população, sobretudo porque a “vibração” não é uma coisa que se sintam com frequência. Há imensas descargas de energia, mas a verdade é que a maioria delas “não é perceptível”. “Mas não tenho dúvidas que toda a energia que traz a onda seja depois conduzida para o lado terrestre”.

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