Análise

“Quer queiram, quer não“

Uma pessoa vem de férias e apetece voltar apressadamente ao ócio, pois encontra a campanha órfã de entusiasmo - até para os comícios rurais o PSD-M sente necessidade de levar autocarros com gente do Funchal -; de ideias fracturantes que exijam reflexão - o economista francês Thomas Piketty, na sua obra ‘Capital e ideologia’, propõe um subsídio de 120 mil euros para todas as pessoas aos 25 anos como forma de lhes proporcionar um melhor início de vida adulta! -; e de escrutínio mútuo mais contundente - alguns políticos que não querem comprar chatices acham que isso é apenas tarefa dos jornalistas.

Pior são os tiques de prepotência que julgávamos enterrados por uma geração avessa a gente que não ouve ninguém e por uma ‘renovação’ manifestamente interrompida que, quando se distrai, produz sentenças do género “quer queiram, quer não”.

Há umas verdades para serem ditas antes do dia reflexão. A campanha tem excesso queixinhas e défice de argumentação séria. Tem muito governo toda a hora em propaganda e quase nenhum a dar respostas aos problemas que não fazem intervalo. Tem muitos ataques aos habituais inimigos externos e poucas trocas de opiniões serenas sobre temas decisivos para o futuro colectivo. Tem muita promessa e pouca certeza.

A campanha vive de várias “batotas”. Algumas já estão nas mãos dos fiscalizadores mas, como é hábito, não vão dar em nada e mesmo que acabem na Justiça, comprovar-se-á a velha máxima que “o crime compensa”. Outras carecem de denúncia ou reparo.

Registamos que a Saúde ou a controversa mobilidade aérea tenha sido expurgada da agenda política dos partidos com aspirações de poder.

Registamos o desleixo em importantes organismos públicos regionais que apesar de terem segurança foram assaltados de uma assentada. Esperemos que daqui a uns meses não faltem documentos essenciais.

Registamos que, de repente, o PSD-M peça maioria absoluta, num contexto de luta renhida e incerteza no resultado. Mesmo com margens de conforto superiores a 15 pontos percentuais nas sondagens para as legislativas nacionais, nem o PS se atreve a fazê-lo. António Costa explica: há uma ideia generalizada que “quanto mais se falar de maioria absoluta mais longe ela ficará”.

“Quer queiram, quer não”, desde que começou a campanha há governantes e respectivas máquinas à beira de esgotamento. Como se não houvesse amanhã, vão agora onde antes mandavam o contínuo, fazem ‘porta a porta’ no horário de serviço, fomentam deliberadamente a sobreposição de agendas e de eventos, distribuem camisolas e baralhos de cartas como se fossem vendedores de esperança. Não se esqueçam de respirar.

“Quer queiram, quer não”, domingo que vem há eleições. E com toda a certeza haverá toda aquela azáfama de transporte oficial de ‘doentes’ até às urnas. Não se esqueçam de votar livremente.

“Quer queiram, quer não”, o mundo não acaba às 19h de 22 de Setembro. Aliás, para muitos, da direita à esquerda, a essa hora começa um novo ciclo, seja ele de que espécie for. Mas há gente anestesiada de tal forma com o futuro prometido, que se recusa a antecipar o pior dos cenários. Não se esqueçam que ainda vivemos em democracia.