Crónicas

Os iscariotes dos tempos modernos

Há uns rapazes e raparigas que facilmente se esquecem de quando pediram e de quanto receberam e não estou a referir-me a dinheiro, mas sim de ajudas preciosas para as suas carreiras e as suas vidas

A gratidão, o agradecimento, o tributo são alguns dos sentimentos mais nobres que existem, mas que infelizmente estão a cair em desuso. O cumprimento das leis e o respeito pelo próximo são coisas da história. O simples Obrigado parece que saiu de moda. Mas o pior é quando se faz bem a alguém e em troca vem a ingratidão. E os exemplos vão desde o dar prioridade a um automobilista no meio de um transito infernal e receber a indiferença até o extremo de fazer um favor a alguém e na volta vem o menosprezo. Todos nós, ao longo da vida, conhecemos, bem de perto, aquilo que aqui escrevo. Às vezes apetece mandar tudo à fava e não atender a mais pedidos de ajuda, mas a verdade é que todos precisamos de todos e, sejamos justos, algumas pessoas são reconhecidas, e até mesmo os ingratos um dia voltarão a precisar de ajuda e aí talvez valorizem o nosso apoio passado.

Há Amigos e “amigos”, mas nem sempre é fácil distinguir os verdadeiros, daqueles que, apenas, se aproximam de nós nas horas boas, os chamados “amigos de ocasião”, quando precisam de alguma coisa. Um meu Amigo, dos bons, costuma dizer que “o mais difícil na vida é conhecer pessoas” e tem toda a razão. Já fui traído por alguns a quem muito apoiei e já recebi lealdade de pessoas que não me deviam nada. Só que os maus sujeitos esquecem o que muitos de nós aprendemos em casa: “quando estiveres a subir a escada nunca te esqueças dos que estão a descer, pois um dia a situação pode inverter-se”.

Quem anda na política está mais sujeito a estas situações e basta ler Maquiavel para saber que esta realidade não é de hoje. Temos que que estar preparados para enfrentá-la e distinguir o trigo do joio, protegendo-nos das facadas nas costas e dos falsos moralistas que, à primeira, praticam o contrário do que proclamaram aos quatro ventos. Devemos perdoar, mas nunca podemos esquecer, até porque a cena pode repetir-se, pois quem é desleal uma vez, raramente se emenda. Às vezes até mordem a mão que lhes deu de comer...

Na Região, conheço alguns casos de falsos amigos que por via de conversas com falinhas mansas, lá levaram a água ao seu moinho quando precisavam de apoio, mas agora que estão alcandorados a determinados cargos, ou julgam que os alcançarão, esquecem quem lhes deu a mão nos momentos mais difíceis. Mas Deus não dorme...e os Iscariotes destes tempos modernos acabam sempre por pagar as deslealdades e as suas traições, apesar da caridade cristã mandar que os perdoemos.

Mas o pior de tudo, é quando este tipo de situações acontece na nossa vida social, com pretensos “amigos” ou conhecidos, ou mesmo na esfera familiar. Há uns rapazes e raparigas que facilmente se esquecem de quando pediram e de quanto receberam e não estou a referir-me a dinheiro, mas sim de ajudas preciosas para as suas carreiras e as suas vidas. Depois de servidos viram-se para outro lado até o dia em que voltarão a necessitar de alguma coisa. Aqui dói mais, e nunca estamos preparados para a ingratidão. Mas “aqui se faz, aqui se paga”. Não se trata de engendrar vinganças ou de alimentar ressentimentos que não levam a lado nenhum, mas de acreditar que há uma Divina Providência que vai “regulando” os nossos comportamentos.

É por tudo isto que devemos valorizar as verdadeiras Amizades, aquelas que nasceram nos bancos das escolas, nos liceus e nas universidades e que persistem; aquelas que se foram cimentando nas nossas profissões e locais de trabalho e que sempre se fortalecem e aquelas que fomos fazendo ao longo da vida nos mais diversos locais e que crescem de forma desinteressada. Há os “amigos de conveniência”, com quem até podemos estar com frequência e depois há aqueles Amigos que não falamos durante meses, às vezes anos, mas que na hora da verdade dizem: Presente. São estes que compensam as injustiças e as falsidades dos “amigos da onça” que nos bajulam quando necessitam ou quando estamos na mó de cima e que nos ignoram depois de ajudados ou quando pensam que já não temos poder.

“SIC TRANSIT GLORIA MUNDI” -não me canso de lembrar esta máxima em latim que significa que a glória do Mundo é transitória, sempre que alguém, meu Amigo, começa a exercer um lugar de topo e que, como acontece com a maioria dos seres humanos, tem a tendência para cair no deslumbramento e na arrogância. Não se esqueça, o poder é efémero e nada é eterno!