Artigos

“Jingle bells” q.b.

Elevadores, centros comerciais, passeios, restaurantes, cafés, lojas – nestes dias, onde é que conseguimos estar sem ficarmos expostos a alguma variedade de música “natalícia”?

Ultimamente, os psicólogos começaram a avisar que ouvir música de Natal em demasia pode ser prejudicial para a saúde mental, criando tanto o sentimento de ser encurralado (o imperativo de comprar prendas, organizar jantares e celebrações....) como levando à exaustão daqueles que são obrigados de a ouvir no seu lugar de trabalho durante largas horas e de maneira repetitiva. Por exemplo, conforme a Associação Psiquiátrica Americana, 61% de população sente-se estressada durante a época festiva. Uma vez que a música apela diretamente às nossas emoções, contornando o raciocínio, a única defesa dos trabalhadores expostos a essa música é tentar desligar emocionalmente e não ouvir o que se está a ouvir. Contudo, esse esforço gasta muita energia mental, resultando em cansaço e irritação.

O assim chamado “efeito de mera exposição”, associado à familiaridade prévia com as coisas, funciona também neste caso, mas depois de algumas exposições começa a provocar respostas negativas no cérebro.

Do ponto de vista dos comerciantes, a situação é exatamente oposta: os estudos demonstram que a música festiva induz a vontade de comprar e comprar mais. E, efetivamente, o equilíbrio certo entre os aromas e canções pode causar uma resposta mais positiva relativamente ao ambiente circundante.

No entanto, já há largos anos, a máquina comercial obriga-nos pensar sobre a época festiva meses antes do seu lugar no calendário (caso documentado nos EUA refere já o dia 22 de outubro) e, por isso, quando ela efetivamente chega, muitos de nós já estão cansados, irritados e até mesmo repugnados, sem saber precisamente porquê.

Solução teórica? Evitar esta música até ao mês de dezembro. Mas, na prática, isso simplesmente não resulta. Já o mês de novembro traz os sininhos do trenó e edições especiais de canções de Natal por cantores populares. Para aqueles que no seu trabalho ouvem as mesmas dez canções dez ou mais vezes por dia, traz também um pouco de loucura.

Ademais, numa espécie de “síndrome de Estocolmo”, essas canções aninham-se nas nossas cabeças e, tal e qual uns cucos, expulsam pensamentos coerentes e põem-nos a trautear num ciclo automatizado e vicioso até perdermos a noção de porque é que o estamos a fazer. Nem se fale sobre o tentar adormecer enquanto esses cucos cantam o seu canto de sereia e fazem-nos perder sorrateiramente o juízo.

E alguns destes cucos são propriamente “earworms”, vermes de ouvido, conforme um estudo no jornal Psicologia da Estética, Criatividade e Artes. Isso significa que são melodias insidiosas, chamativas, que se colam à nossa mente e as quais não conseguimos sacudir. Representam assim um enigma mental para o qual cada um precisa de encontrar o seu método de distração – alguns pacientes utilizam palavras-cruzadas, alguns fazem jogging, e outros cantam outra canção qualquer, de preferência, lenta.

Aparentemente, quase um quarto da população americana considera a música sazonal o aspeto mais temido da época e um quarto da população britânica ativamente desgosta da música de Natal. Contudo, os comerciantes dominam a psicologia de mercado e escolhem canções de Natal lentas, que o vão fazer mexer-se mais lentamente na loja e gastar mais tempo olhando para os produtos.

Existem, no entanto, vários aspetos positivos associados à época festiva: o sentido de nostalgia, que nos liga com o nosso passado e os nossos queridos que já não estão connosco, com a altura quando nós próprios ainda acreditávamos no Pai Natal e com os bons tempos vividos com uma pessoa amada. Por conseguinte, decorar a casa e a árvore mais cedo e ouvir as músicas por mais tempo, pode nos ligar mais intimamente com os tempos de outrora.

É altura de viver e demonstrar as emoções mais belas e positivas que somos capazes de sentir, mas quanto mais consciência sobre este fenómeno sazonal tivermos, mais nos vamos poder entregar ao espírito das festas sem sermos “objetos” ou “pacientes”. Bom Natal, Boas Festas e também boa música natalícia... mas q.b.!