Artigos

Literacias

E no meio do habitual esgrimir de retórica, sempre que as avaliações internacionais trienais (PISA) realizadas pela OCDE às competências dos alunos de 15 anos nas literacias da Leitura, da Matemática e da Ciência aparecem, eis-nos perante os resultados referentes a 2018. E numa sociedade aberta como a nossa, em que a liberdade de expressão ganhou legitimidade e peso, há análises para todos os gostos, reveladores, claro, de muita sabedoria, algum posicionamento ideológico e carradas do habitual “achismo”. De entendidos e não só. E no habitual coro de elogios e críticas, lá vem o também costumeiro atribuir dos méritos dos bons resultados, a este ou aquele governo, a este ou aquele Ministro da Educação e atirar os resultados menores como arma de arremesso no debate e no confronto político...

A existência destes testes periódicos está plenamente justificada. Pretendem ser bitolas aferidoras dos sistemas educativos deste mundo globalizado, e verificar de que modo os nossos jovens mobilizam os conhecimentos, capacidades e competências desenvolvidos em meio escolar, e os aplicam em situações da vida prática. E segundo os resultados apresentados, os alunos portugueses têm vindo a melhorar, com uma ou outra flutuação menos positiva nesta ou naquela área do conhecimento, o que também é normal. Há, no entanto, um resultado que se tem mantido ao longo do tempo e que não surpreende também quem anda diariamente na tarimba da escola: a constatação de que o contexto socioecónomico dos alunos mais desfavorecidos condiciona, pode determinar resultados e percursos de sucesso, barrando até, o acesso ao ensino superior, a muitos jovens. Sim senhor! Porque a desigualdade continua a ser o principal entrave que a nossa escola, pese embora o prestigiado caminho percorrido nas últimas décadas, e todas as reformas, mudanças, revisões curriculares e afins, ainda não conseguiu dirimir. No caso da Região, é preciso não esquecer que estamos numa das zonas do país, em que a Ação Social Escolar é ainda uma resposta maioritária, necessária para suprir as dificuldades económicas de um número significativo de famílias.... Será preciso ir muito mais além do formalismo burocrático das recentes e beneméritas medidas de inclusão registadas no papel...

Das literacias avaliadas pelo Pisa, a literacia financeira tem vindo a conquistar adeptos, dada a dimensão das responsabilidades dos Estados, o evoluir das democracias liberais e o poder das instituições financeiras. Também a necessidade de consciencializar os cidadãos para o consumo responsável e sustentável. E para isso, são imprescindíveis as literacias da Leitura, da Ciência e da Matemática. Porque o mundo que nos rodeia e a evolução da humanidade exigem uma constante compreensão e interpretação da realidade. Pode-se, por exemplo, exercitar bem a literacia da Matemática, fazendo uma adequada leitura das estatísticas da pobreza, da desigualdade, do desemprego, dos lucros das empresas, da incidência fiscal, da fuga aos impostos, da injustiça, etc. Assim se exercita também a consciência social, a cidadania, a responsabilidade que cabe a cada indivíduo, de intervir no seu metro quadrado em prol do bem comum. E no que toca à Ciência, é gigantesco o desafio que o avanço da Tecnologia, da Biologia, da Robótica coloca não só à inteligência, ao mundo do trabalho, mas também à Ética, num tempo em que os algoritmos serão decisores em questões humanas. E a urgência colocada pelas alterações climáticas, à sustentabilidade do planeta, à própria sobrevivência da espécie impõe prioridades à Economia e à ação política, em termos de redistribuição de riqueza, combate às desigualdades, promoção da justiça, cuidados de saúde e bem-estar, etc. Sobre a organização da Educação, o historiador Harari (2018), em ”21 Lições para o século XXI” advoga que “as escolas devem (...) passar a ensinar os quatro C: pensamento crítico, comunicação, colaboração e criatividade.” Novas literacias para o PISA avaliar?