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Um desabafo ou um desespero?

Já tivemos demasiadas provas no que toca a pagar medicamentos sem comparticipação, para desespero de muitos colegas meus

Devo começar por me socorrer da Constituição da República Portuguesa que, no seu artigo n. 64.º define que a garantia do acesso dos cidadãos aos medicamentos de que necessitam é uma das vertentes do direito fundamental da proteção da saúde.

É isso mesmo que os polícias no Comando Regional da PSP pedem: acesso aos medicamentos e à assistência médica com preços compatíveis à sua qualidade que lhes permitam, uma vida pessoal e profissional com o mínimo de qualidade e dignidade! Uma vida que permita às crianças e adolescentes que recebem o diagnóstico estudar, arranjar emprego, constituir família!

Por isso mesmo, nós policias elogiamos os esforços do Serviço Regional de Saúde, através do IASAÚDE, que a partir do dia 1 de Outubro de 2019, assumiu os encargos na comparticipação dos medicamentos e produtos de saúde prescritos aos beneficiários do Serviço de Assistência na Doença da Polícia de Segurança Pública (SAD/PSP), é recomendável olhar com cautela para os resultados desta medida que foram e são tornados públicos, sem nos deixarmos enganar por anúncios que mais parecem talhados para seduzir os profissionais da PSP e os seus familiares.

Infelizmente, depois desta data, já tivemos demasiadas provas no que toca a pagar medicamentos sem comparticipação, para desespero de muitos colegas meus. E se retirarmos todas as consequências lógicas, inevitavelmente nos leva a concluir que existem algumas farmácias nesta Região Autónoma da Madeira (RAM) que alegam que não possuem informação oficial da Associação Nacional de Farmácias (ANF).

Isto pode, em parte, explicar as recusas nas comparticipações na aquisição de medicamentos por algumas farmácias no Funchal. Mas também não serve de desculpa aos farmacêuticos, que terão no mínimo de procurar informação e fazer a implementação das medidas e cumprir com todas as formalidades que foram estabelecidos pelo IASAÚDE.

Relembramos aos senhores farmacêuticos que, no tempo da troika passaram dificuldades tremendas com encerramento de muitas farmácias e para garantir a sobrevivência reinventaram-se, com estratégias de publicidade e marketing. Abriram as portas em horário alargado e todos os dias do ano. Promoveram rastreios e ofereceram testes gratuitos de medição de colesterol ou pressão arterial. Nessa altura, existiram “cabazes de Natal” à venda nas farmácias com produtos cosméticos. Lembram-se deste tempo, em que usaram todas as armas disponíveis para atrair os clientes, com cartões, promoções e até descontos em medicamentos comparticipados.

E nós polícias perguntamos! Passados oito anos depois da chegada da troika a Portugal, e dois após a sua saída, o retrato da economia portuguesa deu e dá conta de um país em recuperação moderada, pergunto o porquê dos profissionais da PSP que exercem funções na RAM, sejam os únicos cidadãos em Portugal, que teimosamente continuam a pagar os medicamentos na sua totalidade, especialmente os pacientes que sofrem de doenças crónicas e necessitam de tratamentos permanentes, como diabéticos e hipertensos.

Isto não é num país em vias de desenvolvimento. Isto é em Portugal! Portugal, o membro da União Europeia que recebe milhões de euros de fundos europeus para investir em melhores serviços e cuidados de saúde aos seus cidadãos.

Perdoem-me o uso da primeira pessoa do singular. Mas estou preocupado e estamos vivendo uma situação extremamente grave, com relatos deprimentes, pelos valores exorbitantes pagos em medicamentos, quando cada um de nós desconta cerca de 3,50 do vencimento para o SAD/PSP.

É inaceitável descontar para o SAD, já com valores exagerados, 14 meses por ano quando o subsistema só pode ser utilizado 12 meses, ainda por cima quando não existem praticamente médicos especialistas convencionados e previstos. Por isso, não se esqueçam que nós não somos parvos, nós não somos números! Nós somos seres humanos.

Se calhar o caminho para garantir um acesso aos medicamentos necessários passa por uma estreita colaboração entre todos os intervenientes no processo: IASAUDE, NAF, SAD e MAI e eventualmente, com outras entidades governamentais. Quero acreditar que este mecanismo de coordenação já existe, mas claramente algo não está a funcionar. Será que há mesmo diálogo ou é apenas um monólogo?