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Economia Europeia em Piloto Automático para o Precipício

Mario Draghi há muito que ligou o piloto automático e deve deixar assim a economia europeia até ao fim do próximo ano, altura em que terminará o seu mandato na presidência do Banco Central Europeu (BCE). O atual programa de compra de ativos deve manter-se até ao fim de 2018, tal como já tinha sido anunciado pela entidade, e a taxa de juro de referência só deve ser mexida lá para setembro de 2019.

Quaisquer alterações nas atuais políticas monetárias envolve riscos crescentes, pois ainda sofremos a ameaça de um possível deterioramento na inflação. Um pouco por toda a europa, o gap entre o enriquecimento das empresas e dos seus trabalhadores está aumentando. Como não é esperado que os salários cresçam ao mesmo ritmo da economia durante o próximo ano, é de esperar que as incertezas relativamente à evolução da inflação se mantenham.

O endurecimento da guerra comercial iniciada pelos Estados Unidos e a possibilidade de esta grande potência mundial entrar em recessão, são dois novos fatores de risco que o BCE tem de equacionar. O aumento nas taxas das importações nos EUA poderá ter um impacto muito negativo no crescimento do PIB europeu, dado o elevado grau de abertura comercial e o alto grau de integração nas cadeias de valor globais.

Por outro lado, muitos economistas consideram que a economia americana está na fase final do atual ciclo de crescimento, e que uma nova recessão estará para breve. Realmente, o grau de alavancagem da dívida soberana norte-americana tem aumentado significativamente e a história mostra-nos que quando vemos este grau de alavancagem apoiado por um aumento de rendimento de curto prazo, acabamos sempre numa recessão. Os cortes nos impostos de Trump estão efetivamente a dar um empurrão à economia durante este ano. Muito provavelmente, o crescimento continuará até o primeiro semestre de 2019, mas em 2020, justamente na altura em que o BCE prevê retirar as “bengalas” à economia europeia, há uma grande probabilidade da economia Americana entrar em recessão.

A possibilidade de uma recessão apoiada com os danos colaterais de um endurecimento da guerra comercial podem criar uma mistura explosiva nos Estados Unidos, mas o problema é que a onda de choque irá apanhar uma Europa ainda muito combalida para aguentar o impacto. Ao contrário da Europa, os Estados Unidos da América já se encontram preparados para enfrentar uma nova recessão. O ciclo de recuperação nesse país já alcançou os 108 meses de crescimento ininterrupto, e é já o terceiro maior da sua história. A Europa, por outra parte, seguiu mais ou menos os mesmos passos que a FED para reagir à crise iniciada em 2008, mas começou muito mais tarde e por isso os efeitos positivos são ainda muito tímidos. Na europa, o BCE continua a comprar 30.000 milhões de euros de ativos todos os meses, ainda nem tocou nas taxas de juro porque continua à espera de um sinal forte de uma inflação que não está a reagir aos estímulos. Se a economia Norte-Americana cai no fim de 2019 e arrasta a europeia, o BCE terá apenas capacidade de voltar a comprar ainda mais dívida ou de optar por medidas mais drásticas, como a desvalorização da moeda com taxas de juro negativas. Sem as armas necessárias, verificando-se uma recessão nos EUA quando Draghi desligar o piloto automático, haverá alguém capaz de redirecionar a economia europeia para longe do precipício?