Crónicas

Um murro no hospital

Quando a tutela deste sector passou para a Região a administração central fez um excelente negócio. Porque se livrou de uma despesa que antes era sua e não assumiu os encargos que, por imposição legal, eram inerentes àquela transição.

Passados alguns dias a comparticipação nacional para a construção do novo hospital da Madeira passou de 50% para 30% e, agora, parece que resta nuns escandalosos 13%, a crer nas últimas versões vindas a público. A terreiro já vieram as clarificações e os protestos que se impunham. Denunciando a artimanha da surreal conta de mercearia chunga que tenta justificar a aldrabice para chegar àqueles valores.

Junto argumento de outra ordem aos já oportunamente emitidos. Este procura fundamentar o direito e qualificar a reivindicação.

No Orçamento para 2019, supostamente, vão constar verbas para cinco unidades hospitalares. O executivo pátrio paga quatro na íntegra e alguma coisa (que não podemos precisar) do nosso. Porquê só uma parcela (substancial ou ínfima?) se a Saúde é prerrogativa constitucionalmente garantida para todos os portugueses e da responsabilidade do Estado?

Porque ficamos com as receitas dos nossos impostos dirão os mais expeditos. Esse é um dos logros da Autonomia.

Assim acontece para fazer face aos custos com as desigualdades derivada da insularidade, da ultraperiferia, da distância, do afastamento geográfico e dos seus inúmeros constrangimentos. Que vão muito para além da indispensável mas insuficiente ajuda orçamental que nos chega de Lisboa para este fim. Mas também para custear os serviços, no passado regionalizados sem as devidas compensações financeiras por parte da República, como prevê a lei.

Ao contrário do que se pratica em todas as comunidades espanholas.

Da mesma forma que quando se discute a descentralização para as autarquias, fala-se sempre em assumpção de novas atribuições em conformidade com o envelope que junta a quantia correspondente considerada adequada.

Quando a tutela deste sector passou para a Região a administração central fez um excelente negócio. Porque se livrou de uma despesa que antes era sua e não assumiu os encargos que, por imposição legal, eram inerentes àquela transição.

As infraestruturas foram crescendo ao longo da ilha através dos anos e, de repente, em vez de 18 estabelecimentos destinados a oferecer cuidados médicos (15 eram meros dispensários materno-infantis) passamos a ter 51 (dos quais 48 são centros de saúde). Os gastos com essas actividades de funcionamento subiram exponencialmente. Juntando a Saúde à Educação lá vão metade das nossas receitas. O dispêndio presente é completamente diferente. E se a regionalização acontecesse hoje cabia ao Estado responsabilizar-se por contrapartidas de montante bem superior ao que no passado poderia ter sido contabilizado. Tal como está disponível, no âmbito da descentralização em curso ou em discussão, para remunerar as câmaras pela delegação e transferência de competências.

Aquelas edificações não são serviços, mas foi o executivo madeirense que proporcionou à população as condições estruturais que, nesta área, cobriram todo o arquipélago. Agora uma construção com a dimensão de um hospital já não creio que compita a um governo insular, como também não faria sentido caber na alçada de um município.

É certo que sendo projecto de interesse comum a legislação refere-se tão só a uma vinculação de cofinanciamento. Mas já que o poder concentrado na capital não cumpriu com porção substantiva das suas obrigações desde o inicio do processo autonómico, acresce mais uma razão para custear a obra, senão na totalidade (prática que adopta em relação ao restante território nacional), pelo menos em quantidade bem mais razoável e justa do que os números recentemente noticiados.

Não me surpreende o incumprimento sistemático como se deduz do que escrevi antes. É constante o defraudar das nossas legítimas expectativas.

Fica difícil a pessoas bem educadas classificar a injustificada descriminação como arma de arremesso partidário. Só possível à conta de uma arrogante impunidade política. Que tem almofada conivente e tolerante entre os que parecem conviver, sem problemas de consciência, conluiados e cúmplices, com o comportamento autista e estrangulador da oligarquia centralista.