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Da política

Não é legítimo condicionar ou impedir o direito de votar, independentemente da preparação do votante.

Quando alguém vota exerce um poder político sobre os outros. No mínimo deveríamos questionar: “porque é que essa pessoa há-de ter qualquer grau de poder sobre mim?”. Assumindo a evidência de que a grande maioria dos eleitores não se prepara minimamente para votar, é legítima a interrogação e o receio das consequências possíveis do acto.

Apesar da maior parte dos cidadãos votantes ser incompetente, ignorante ou moralmente pouco razoável em matéria de política, nada é possível fazer, num regime democrático, para impedir que contribua para eleger um governo em nome de todos, mesmo dos que votaram contra e dos que não votaram.

Não é legítimo condicionar ou impedir o direito de votar, independentemente da preparação do votante.

Uma parte substancial dos eleitores é filiada ou simpatizante de partidos políticos. Os partidos são máquinas de conquista de poder e funcionam com base em ideologias e plataformas políticas. Tal facto motiva que os aderentes, filiados ou simpatizantes, embora possam ter preferências e idiossincrasias próprias, tenham tendência a seguir e fazer o que preconizam os partidos.

Esse respaldo ideológico chamemos-lhe assim, permite aos eleitores individualmente agirem como se fossem razoavelmente informados. Apesar de muitos dos votantes (e não votantes) não terem uma compreensão razoável daquilo que os diversos partidos políticos pretendem fazer.

A maior parte dos eleitores nunca leu os programas dos partidos em que pretende votar. Muito menos, os programas dos outros partidos.

Mesmo que o fizessem, o resultado seria dificilmente melhor porque muito poucos possuem o conhecimento político, económico e sociológico para avaliar devidamente as boas ou más consequências que pudessem advir de por na prática o que é enunciado nos programas políticos.

Mesmo considerando que há quem possua esses conhecimentos, a capacidade de escolha dos votantes está limitada aos elementos previamente escolhidos pelas cúpulas partidárias e que fazem parte das respectivas listas.

Por outro lado, os partidos políticos, não raras vezes, escolhem candidatos que julgam ser apelativos para o votante comum.

A grande maioria dos eleitores não segue doutrinas políticas extremistas, nem de direita nem de esquerda. Por tal facto, mesmo partidos/candidatos de extrema-esquerda ou de extrema-direita, em tempo de campanha eleitoral, adaptam o seu discurso para “pescar” ao centro, onde se encontra o grosso do eleitorado.

Espera-se que a democracia dê voz igual a todos os cidadãos. Evidentemente que esse objectivo é impossível de alcançar.

Além disso, após as eleições, há um longo caminho até que algumas das promessa, independentemente da seriedade com que são feitas, consigam navegar pelos meandros burocráticos e contingências diversas, pelas barreiras legais e administrativas, até poderem ser aprovadas e postas na prática. A burocracia governativa tem vida própria. Exige dos eleitos preparação, conhecimentos, determinação e motivação.

Estas são algumas questões inerentes ao sistema eleitoral e ao funcionamento de uma democracia.

São questões que ocupam teóricos, politólogos e filósofos políticos e têm a ver com as características de um sistema democrático.

Há decisões políticas competentes e incompetentes. Há eleitores e eleitos competentes e incompetentes.

É evidente que o sistema democrático é competente em uns aspectos e incompetente noutros.

Também é verdade que a maior parte das eleições tem um impacto elevado nas subsequentes decisões governativas, independentemente das competências dos votantes individuais.

É, de certo modo, fácil expor as patologias da democracia. Muito mais difícil é criar um sistema alternativo cujas vantagens suplantem significativamente o sistema democrático com sufrágio universal.

Aqui fica para a vossa (e minha) reflexão.