Proteger o que é nosso

Só saberemos para onde queremos ir se pudermos olhar para trás para chegar à frente. Se aprendermos para construirmos

O incêndio de grandes proporções que consumiu no passado dia 2 de Setembro parte do Museu Nacional na Quinta da Boa Vista no Rio de Janeiro, destruindo quase a totalidade do acervo histórico e cientifico construído ao longo de 200 anos foi um rombo no património cultural do Brasil mas também no de Portugal. É que convém não esquecer que este Palácio foi construído na altura das colónias portuguesas e que foi residência imperial. É por isso insubstituível e incalculável o que se perdeu do trajecto luso brasileiro e no fundo se quisermos do nosso périplo pela América Latina. No entanto na comunicação social pouco disso se falou. E do que se falou foi como se fosse uma coisa lá “deles” que nada tinha a ver connosco que era uma pena para “eles” mas que isso significava zero para nós.

Nada mais errado. Foi uma parte da nossa história que perdeu o seu objecto palpável, que deixámos de poder ver e por isso de sentir aquilo que eu senti quando por lá passei. E isso encerra em si vários problemas e questões.Quero no entanto centrar-me no futuro e na aprendizagem que devemos levar desta tragédia até porque já percebemos que a maioria das pessoas e da comunicação social nos dias que correm teria ligado mais se a Cristina Ferreira tivesse perdido um sapato na Amazónia do que na delapidação tácita de parte importante da nossa identidade material como se veio a confirmar o que até acaba por ser normal dada a falta de ligação entre a sociedade e o seu património talvez um pouco por culpa do Estado que nos faz sentir que aquilo é muito seu e pouco nosso como se o Estado não devêssemos ser nós.

Há no entanto várias mensagens que daqui podemos retirar que nos transportam para o futuro. Qual é o grau de conservação dos nossos museus ? Em que estado se encontra o nosso património histórico? O que estamos a fazer para o proteger e preservar? Estaremos nós preparados para não deixar que isso nos aconteça a nós num futuro próximo ? E de que forma devemos orientar a estratégia que dignifique verdadeiramente o que é nosso criando de facto uma identificação profunda e uma relação forte entre a sociedade e os seus monumentos? Para mim tudo começa na Educação. Se não instigarmos os nossos jovens a relacionarem-se com o património que é deles , com a sua história e com o seu passado nunca lhes daremos a devida importância.

Esse mesmo património precisa de ser cuidado e isso significa receber vida. Necessita de ser visitado, reconhecido e acarinhado pelos mais novos. De ter a devida atenção , comunicação e empenho dos Governos e isso significa projetar o que tem interesse relevante e assegurar através de parcerias público-privadas a devida rentabilização do resto obrigando os privados a tratar da manutenção dos edifícios. Não podemos deixar os espaços caírem de podre só porque não temos dinheiro para os cuidar quando podemos colocar o ónus em cima de privados através de regras bem definidas. Isso permite-nos alocar o dinheiro na dinamização e na projeção da nossa verdadeira história. Esse palavrão chamado “cultura” é parte fundamental da nossa essência. Só saberemos para onde queremos ir se pudermos olhar para trás para chegar à frente. Se aprendermos para construirmos, se reconhecermos e cuidarmos para evoluirmos. O nosso património leva-nos a tudo isso.