Crónicas

Verão Quente

O verão está aí à porta e o calor vai apertar e com ele vai apertar o receio de violentos incêndios. Esperemos que não ocorram, mas nunca é demais lembrar que prevenir é sempre o melhor remédio

Não tarda muito e aí estará o verão do nosso contentamento depois de um inverno assim-assim, mas que já vai deprimindo. Venha o calor e os longos dias e noites de convívio e diversão. Mas, com o calor lá vem a época dos fogos e temos que estar preparados.

Na última década a Madeira foi atingida por 4 incêndios violentos que provocaram grandes danos humanos, materiais e ambientais. Os anos 2010, 2012, 2013 e em particular, 2016, ficam na história como anos trágicos para a floresta madeirense, mas sobretudo para muitos funchalenses que perderam familiares, casas e bens de uma vida. Recorde-se que há 2 anos, o fogo começou nas encostas do Funchal e rapidamente desceu até ao centro da cidade, provocando 3 mortos, atingindo 208 imóveis, originando mil desalojados e prejuízos da ordem dos 70 milhões de euros. Foi o grande susto e aí sentiu-se o quanto estamos inseguros perante os elementos da natureza depois da água na tragédia do 20 de fevereiro.

É verdade que a história da Madeira está marcada por ocorrências de fogos de grandes dimensões, a começar - garantem alguns - pelo início do povoamento, mas é igualmente certo que os incêndios vêm acontecendo com intervalos mais curtos e que importa reduzir os fatores de risco associados à sua eclosão. E é também uma realidade que as alterações climáticas vieram tornar a ilha mais vulnerável às catástrofes naturais, como demonstram todos os estudos efetuados e como temos testemunhado nos últimos anos.

Entre 2006 e 2016 quase um terço do território foi atingido pelo fogo e é mais do que evidente que para além dos meios de prevenção e combate, temos que atuar contra as causas que estão na sua origem, como a ausência de políticas corretas de planeamento e ordenamento do território, a desertificação do mundo rural e o abandono de terrenos agrícolas, a proliferação de eucaliptos e outras espécies altamente combustíveis, a falta de limpeza de vastas áreas de floresta, a elevada densidade populacional num terço do território; a construção em zonas de risco e a degradação de zonas habitacionais com grande número de prédios devolutos nos centros das freguesias e cidades, nomeadamente no Funchal. Mudar todas estas situações levará décadas, mas importa começar e diga-se em abono da verdade que aprendemos alguma coisa com o último grande incêndio, já que, desta vez, o fogo não foi lá na serra ou nas zonas altas, mas atingiu o coração do Funchal e rondou as casas de quem manda e de quem decide e isso faz toda a diferença. A criação de linhas corta fogo à volta da cidade; a recuperação das torres de vigilância nas montanhas; o reinicio da reflorestação nalgumas zonas; a limpeza de terrenos públicos e privados; a aposta na reabilitação urbana, o reforço dos meios dos bombeiros e da proteção civil, o meio aéreo prometido e a implementação do Programa Operacional de Combate a Incêndios Florestais (POCIF), são medidas que se saúdam e que são importantes para reduzir o impacto dos fogos e o seu rasto de destruição. No entanto, estamos longe, muito longe, de fazer o que nos compete para encarar este problema com toada a coragem e seriedade que ele exige.

A Estratégia de Adaptação da Região às Alterações Climáticas, criada em 2015, é preocupante no seu diagnóstico e previsão: “Tanto a floresta Laurissilva, como a floresta plantada, encontram-se em áreas de acentuados declives, o que favorece a propagação do fogo, dificultando o seu combate. Na vertente sul, onde predomina a floresta plantada, o clima é mais seco do que na vertente norte, aumentando o risco de incêndios. Dadas estas condicionantes naturais e o histórico recente de incêndios florestais, a vulnerabilidade atual da floresta é classificada de como negativa. O aumento do risco de meteorológico de incêndio em todos os cenários futuros considerados, aumenta a vulnerabilidade da floresta, em particular, da floresta plantada, para muito negativa no longo prazo.” Face a estas perspetivas não podemos ficar indiferentes.

A Madeira precisa de um Sistema e de um Plano de Defesa da Floresta Contra Incêndios que envolva o Governo, as Câmaras, as Juntas de Freguesia, a Proteção Civil e Corporações de Bombeiros, o Instituto do Mar e da Atmosfera, as Forças Armadas, as Forças de Segurança, a Polícia Florestal, as Associações do Ambiente, as Escolas, as Paróquias, as Empresas e os Cidadãos, para mudar as políticas, reduzir os riscos, prevenir as ocorrências e combater os fogos, reduzindo os danos humanos, materiais e ambientais.

O verão está aí à porta e o calor vai apertar e com ele vai apertar o receio de violentos incêndios. Esperemos que não ocorram, mas nunca é demais lembrar que prevenir é sempre o melhor remédio.