Crónicas

Se for do Rum?

O furacão Irma passou e deve ter provocado, tal como noutras paragens, danos devastadores. Mas seguiu caminho. Antes, já outro tinha ido para lá morar. E ficou

Não percebo bem o que é Porto Rico. Faz parte dos EUA? Por um lado não. Logo, de modo nenhum pode ser um estado federado, muito menos uma região autónoma. Por outro sim, pertence ou integra como Estado Associado, sem personalidade jurídica. O seu presidente é Trump mas estão impedidos de o eleger. Têm um governador e consequentemente um governo mas a soberania é americana. A nacionalidade é porto-riquenha mas são cidadãos estado-unidenses. Muitos tratam-no como país independente mas não é. E, aparentemente, não quer sê-lo. O ultimo referendo (2012) sobre o assunto levou a que os naturais dali, por larga maioria, votassem no “não” ao “status quo” espécie de colónia territorial e “sim” ao estatuto de Estado, mas depois gerou-se uma interminável confusão que até hoje fiquei sem saber do seu desenlace. Parece que ficou mais ou menos na mesma. Enfim, tenho dificuldade em definir constitucionalmente esta situação, nem sei bem o que significa. Não estudei este conceito no direito. Mas, apesar de interessante, há outros temas relativos àquele território do Mar do Caribe que merecem um comentário e cabem neste texto.

Um tem a ver com a surpreendente declaração de falência que os seus governantes tornaram pública recentemente, antes do nosso Verão. O insólito e inesperado acontecimento justifica este sublinhado.

Porto Rico tem cerca de 3,6 milhões de habitantes, é um destino turístico afamado fazendo parte das conhecidas ilhas caribenhas de Cuba, Haiti/República Dominicana e Jamaica. Depois de ter sido durante quatro séculos uma colónia espanhola passou à posse dos norte-americanos e assim continua nesta relação híbrida que falei acima e que tratam como Estado Livre Associado.

Iniciou agora os procedimentos contra credores. São setenta e três mil milhões de dólares de dívida pública, além dos cinquenta mil milhões em obrigações com pensões. Esta opção serve, segundo dizem, para que possa pedir em tribunal uma redução dos compromissos financeiros depois de falharem as negociações com os que lhes emprestaram o dinheiro. Mas é mau para ambas as partes. Para aqueles de quem são devedores porque vão perder as quantias aplicadas, para o governo insular porque perde confiança e credibilidade e jamais terá investidores a apostar naquele espaço ilhéu.

O que se segue? O lugar onde se administra a justiça vai decidir. E vai levar tempo a fazê-lo. Enquanto o pau vai e vem, aliviam-se as costas. É nisto que pensou Ricardo Rosselló, governador, quando tomou a decisão de submeter a questão ao foro jurisdicional. Até lá o povo não é chamado às inevitáveis responsabilidades que vão surgir quando a decisão judicial for tomada. Na ocasião, provavelmente, surgirão mais dificuldades. Digo mais porque vem de 2006 a crise naquele arquipélago. Nessa altura naturalmente contagiada pela dos Estados Unidos. Mas, por ali, já lá vão onze longos anos e, tudo indica, não caminha para melhor.

Resta saber como se constituíram e acumularam estes avultados encargos. Se foi para investimento, as infraestruturas perduram para serviço da população, seja a do tempo que passa seja a futura. Agora se foi para outro efeito fica um pouco mais difícil de entender. Por exemplo, como fizeram os islandeses. Que, de repente, e em colectivo acharam que eram todos financeiros. Mas esses, em três anos, deitaram para trás das costas a insolvência e a austeridade e hoje são uma nação em franco crescimento.

A crise mais profunda em Portugal durou menos e o país mostra já, com evidência, sólida recuperação. Os números abonam a favor e parecem indiscutíveis. E quanto à dívida, problema maior, todos têm. Com dimensão diferente, é certo. Em mãos competentes não será impossível de resolver. Naturalmente com tempo, diplomacia e ajuda europeia. Mas o que se passou no continente e na região (as ultimas noticias em matéria de finanças são promissoras), apesar da apreensão suscitada e das dificuldades sentidas, não se pode comparar com o que está acontecendo em Porto Rico. Seja com as opções, com o caminho, com a adoptada solução final e com as prováveis consequências nefastas que daí resultarão. Que podem, segundo o Secretário do Tesouro norte-americano, “ter efeito de contágio a todo o país”.

O furacão Irma passou e deve ter provocado, tal como noutras paragens, danos devastadores. Mas seguiu caminho. Antes, já outro tinha ido para lá morar. E ficou. As pessoas só vão senti-lo ao “ralenti”. Quando despertar dos tribunais. A não ser que a nação associada encontre forma de “deitar a mão” evitando a inconveniente propagação dos estragos. Se é que já não deu.

E, por fim, já que estamos em águas transparentes e tépidas, de um azul esverdeado único em perfeito conluio com o sol e as praias de areia branca que caracterizam as ilhas das Caraíbas, vamos terminar com o espírito que aquele ambiente sugere.

Uma equipa de cientistas a trabalhar por ali detectou um sinal de rádio enquanto observava a estrela vermelha anã que fica a onze anos-luz de distância e é denominada “Ross128”. Ora, deste acontecimento misterioso resultaram várias hipóteses entre as quais a existência de inteligência extra-terrestre.

Lembra-me a propósito um comentário nas redes sociais sobre a estranha ocorrência que questionava se não seria mais assustador estarmos sozinhos no Universo do que com companhia. Diria, depende da companhia. Porque há casos em que mais vale só do que mal acompanhado.

Mas, voltando às hipotéticas explicações para o evento astronómico incomum, modéstia à parte, eu não descartaria a hipótese Bacardi, - bebida alcoólica famosa produzida naquela região insular, mais exactamente em San Juan, considerada a capital mundial do rum, - como uma eventualidade verosímil. Melhor dizendo, o consumo da dita. Pelos investigadores, em noite de alguma descontração e alegria. Vou mais por aí.