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O Funchal e as Árvores

O Funchal já não é o que era. Mudou. Não foi pelas ruas fechadas, pelos prédios que esperam pela prometida reabilitação, nem sequer pelas esplanadas que invadiram a cidade. O Funchal mudou, porque a Câmara decidiu perseguir e abater as suas árvores. Sem apelo nem agravo. Das zonas altas até ao centro da cidade, os atentados contra o nosso património natural são demasiados para enumerar. Mas o que se fez na Rua do Bom Jesus, impressiona pela frieza e pela dimensão. Vinte e seis seres vivos condenados à imediata sentença de morte. Abatidas à pressa e sem se poderem defender. Ali mesmo no coração do Funchal. Árvores saudáveis ou doentes, novas ou velhas, mais ou menos inclinadas – todas tiveram o mesmo destino. Dizem que as árvores crescem em silêncio, mas na Rua do Bom Jesus caíram, uma a uma, ao som metálico das motosserras. Do Presidente da Câmara nem uma palavra. Da vereadora do ambiente muito menos. Até que, a muito custo, lá vieram explicar que, afinal, as raízes das árvores invadiram as redes de àgua e esgotos e que não havia alternativa ao seu corte. E assim, ficámos a saber que, hoje em dia, não há árvore no Funchal que esteja a salvo da fúria arboricida de quem manda na cidade. Preocupados com o efeito da razia, os carrascos prometeram novas árvores em substituição das sacrificadas. Tudo ficaria como dantes, disseram. O que não explicaram, foi o caixão de betão onde querem plantar as árvores, que a julgar pelo seu tamanho é a melhor garantia de que as árvores prometidas, afinal, nunca passarão de arbustos. O que não disseram, foi que tinham feito a mesma promessa, depois de cortarem dois jacarandás na Rua João de Deus. Passado um ano, as novas árvores não vieram e no seu lugar restam, persistentes, dois troncos mutilados, a lembrarem-nos da beleza dos jacarandás que ali viveram. Será assim na Rua do Bom Jesus. Juntamente com as árvores, perderam-se as memórias e as cores daquela artéria da cidade. Do vermelho das pequenas flores até ás luzes que iluminavam a rua no Natal. Já muito se perdeu, mas que nunca nos falte a esperança de dias melhores. Para as árvores e para o Funchal.