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O Episódio dos ‘Secos e Molhados’ pode “ressuscitar”

Se alguma coisa nos pode evidenciar na História dos 150 anos da Polícia de Segurança Pública (PSP) a servir Portugal, é o facto dela ser abundante em casos que servem de ensinamentos que podem justificar ações presentes ou futuras e deles tirar a devida lição. No entanto, muitos não querem aprender com ela e remetem para o seu egocentrismo toda a moralidade envolta numa toga justiceira, esquecendo mesmo o seu próprio passado.

Os acontecimentos de 21 de abril de 1989, no Terreiro do Paço em Lisboa, agora celebrados e recordados no seu 28 aniversário (é verdade já passou este tempo todo), ultrapassou largamente o aspeto lamentável do confronto polícias contra polícias, numa ação que ficou batizada como “Secos e Molhados”.

Os sindicalistas da ASPP, manifestaram-se pelo direito de associação na PSP, à atribuição de uma folga semanal, à transparência na justiça disciplinar, a melhores vencimentos e condições laborais, quando tiveram de enfrentar colegas, a quem tinha sido dada a ordem para dispersar e usar a força nos manifestantes.

Sem embargo, a data é de facto importante, uma das mais relevantes do século XX português e a mais marcante no seio policial. A razão é simples, evitou-se a hipótese, na altura muito real, de ocorrer um autêntico banho de sangue entre polícias.

Tratou-se na verdade, de uma prova evidente da falta de disponibilidade, mesmo de incapacidade, para o diálogo por parte do então Governo que noutras frentes adotaram o mesmo comportamento, de uma política de “quero, posso e mando”, com base numa maioria eleitoral que foi assumida como justificação para os comportamentos e para nunca se fazer “mea culpa”.

Relevo e defendo esta efeméride, para que o Ministério de Administração Interna (MAI), o corpo de oficiais, chefes e agentes da PSP tome consciência do descalabro gigantesco, do grau de infâmia alcançado e de como se pode “destruir” uma Instituição policial magnífica, a qual apenas em poucos anos, tinha 25.000 homens e mulheres, espalhados por todos os distritos do continente e ilhas, quando presentemente dispõe apenas 21.000, 740 dos quais no Comando Regional, profissionais conhecidos pela geração dos oitocentos euros, é a remuneração atribuída a um polícia formado (mão de obra qualificada) na Escola Prática de Polícia.

O episódio dos “ Secos e Molhados” deu-nos (devolveu-nos) a Liberdade e os poucos direitos que ainda temos, e se isso não é tudo, nem toda a necessidade, nem todo o sonho, é todavia a condição de tudo o que constituiu, a nossa dignidade policial. Somos, por obra e graça dos “secos e molhados”, polícias e cidadãos integralmente. Livres mesmo quando gritamos a nossa razão sob os jatos de água dos colegas em serviço.

Comemorar o 21 de abril de 1989 é registar que passa um aniversário da conquista (ou se preferirem, da reconquista) dos nossos direitos, concretamente, o descongelamento das carreiras, dos índices remuneratórios e das promoções, a não degradação das esquadras, dos equipamentos e das viaturas, à falta gritante de efetivos.

Entretanto, alguma coisa terá de fazer os profissionais da PSP, nascidos e criados do acontecimento dos “secos e molhados”. A primeira resposta foi dada pela ASPP/PSP em abril último, em comemorar o 21 de abril de 1989, com unidade, com força, com firmeza. Porque não podemos regressar. Não queremos regressar. Podemos ressuscitar o acontecimento dos “Secos e Molhados”.